Texto
Resolvo-me a contar, depois de muita hesitação, casos passados há dez anos – e, antes de começar, digo os motivos porque silenciei e porque me decido. Não conservo notas: algumas que tomei foram inutilizadas, e assim, com o decorrer do tempo, ia-me parecendo cada vez mais difícil, quase impossível, redigir esta narrativa. Além disso, julgando a matéria superior às minhas forças, esperei que outros mais aptos se ocupassem dela. Não vai aqui falsa modéstia, como adiante se verá. Também me afligiu a ideia de jogar no papel criaturas vivas, sem disfarces, com os nomes que têm no registro civil. Repugnava-me deformá-las, dar-lhes pseudônimo, fazer do livro uma espécie de romance; mas teria eu o direito de utilizá-las em história presumivelmente verdadeira? Que diriam elas se se vissem impressas, realizando atos esquecidos, repetindo palavras contestáveis e obliteradas?
(RAMOS, Graciliano. Memórias do cárcere. Rio, São Paulo: Record, 2004, p. 33)
Que alternativa abaixo não resulta de leitura adequada do texto?
No excerto, dá-se um processo argumentativo, cujo objetivo é justificar a escrita do texto e a suposta demora do autor para iniciar-se essa tarefa.
O interesse do autor seria o de dar ao seu texto um aspecto romanesco, embora lhe fosse repugnante a ideia de deformar personagens ou atribuir-lhes nome falso.
O autor considera importante que seus leitores entendam que o que ele irá contar realmente aconteceu, muito embora aceite que sua versão da história pode ser contestada.
O uso das notas tomadas pelo autor serviria, conforme seu pensamento, para atestar a legitimidade factual do relato.
O autor julga que, para a redação de seu texto, é importante preservar bem a memória do passado.