Texto I
Psicologia de um Vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Profundissimanente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme – este operário das ruínas –
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
(AUGUSTO DOS ANJOS / seleção de textos, notas, estudos biográfico, histórico e crítico e exercícios por Zenir Campos Reis.– São Paulo:Abril Educação, 1982. Literatura Comentada. Página 19)
Texto 2
O morcego
Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
“Vou mandar levantar outra parede...”
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minha alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
(AUGUSTO DOS ANJOS – idem, ibdem, página 18)
Apresentação do autor:
Trata-se de um autor de difícil enquadramento nos limites de uma estética literária, pois sua poesia (a que muitos dão o nome de poesia da estranheza) incorpora elementos de diversas tendências e estilos. Apesar disso, Augusto dos Anjos é – à falta de melhor classificação – colocado no período a que se convencionou chamar Pré-Modernismo.
I – Ambos os textos, quanto ao seu aspecto formal, representam uma reação à estética parnasiana, cuja preocupação primeira é com a elaboração técnica do texto, traduzida pela expressão “arte pela arte”.
II – A leitura dos dois poemas confirma a tendência renovadora de seu autor: a desvinculação da palavra o compromisso com o belo, pelo uso de vocábulos que a tradição julga apoéticos.
III – No texto I, o poema enfatiza um “eu” particular, bastante subjetivo, contrariando uma tendência desse autor, que procura, na maior parte de sua produção, uma abordagem mais universalizante.
I, II e III – corretos.
I e II – corretos; III- incorreto.
I- correto; II – incorreto; III- correto.
I- incorreto; II – correto: III – incorreto.
I- incorreto; II e III – corretos.