TEXTO
Grito Negro
Eu sou carvão!
E tu arrancas-me brutalmente do chão
e me fazes tua mina, patrão.
Eu sou carvão!
[225] E tu acendes-me, patrão,
para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não, patrão.
Eu sou carvão e tenho que arder sim;
queimar tudo com a força da minha
[230] combustão.
Eu sou carvão;
tenho que arder na exploração
arder até às cinzas da maldição
arder vivo como alcatrão, meu irmão,
[235] até não ser mais a tua mina, patrão.
Eu sou carvão.
Tenho que arder
Queimar tudo com o fogo da minha
combustão.
[240] Sim!
Eu sou o teu carvão, patrão.
CRAVEIRINHA, José João. Karingana Ua Karingana. (Era uma vez). Lisboa: Edições 70, 1982.
José João Craveirinha foi o primeiro autor africano que ganhou o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa.
Sobre o poema Grito Negro, é INCORRETO afirmar que
nos versos “Eu sou carvão!” (linha 224), “Eu sou carvão;” (linha 231), “Eu sou carvão.” (linha 236), a pontuação demonstra, respectivamente, expressividade, causa e desumanização.
os versos “Tenho que arder / Queimar tudo com o fogo da minha combustão.” (linhas 237- 239) apresentam o momento de indignação, fazendo o eu lírico erguer-se contra o opressor.
o poema apresenta o negro conformado à condição imposta e aceitando trabalhar e servir aos seus senhores.
o poema discute questões raciais, quando a cor do carvão remete à cor da pele negra e o jogo metafórico apresenta a relação entre as características do carvão e a ação de queimar.