TEXTO
A enxada
[...]
Na Forquilha, recebeu Supriano um pedaço de mato derrubado, queimado e limpo. Era do velho Terto, que não pôde tocar por ter morrido de sezão. Como o delegado houvesse aprevenido o novo dono de que Piano era muito velhaco, ao entregar a terra Elpídio ponderou muito braboso:
— Quero ver que inzona você vai inventar para não plantar a roça... Olha lá que não sou quitanda! Supriano não tinha inzona nenhuma.
Perguntou, porque foi só isso que veio à mente do coitado:
— E a enxada, adonde que ela está, nhô? Elpídio quase que engasga com o guspe de tanta jeriza:
— Nego à toa, não vale a dívida e ainda está querendo que te dê enxada! Hum, tem muita graça! Piano era trabalhador e honesto. Devia ao delegado porque ninguém era homem de acertar contas com esse excomungado. Pior que Capitão Benedito em três dobros. Se, porém, lhe pagassem o trabalho, capaz de aprumar. Não tinha muita saúde, por via do papo, mas era bom de serviço. Assim, diante da zoada do patrão, foi pelando-se de medo que o camarada arriscou um pedido:
— Me perdoa a confiança, meu patrão, mas mecê fia a enxada da gente e na safra, Deus ajudando, a gente paga com juro...
— Ocê que paga, seu berdamerda! — E Seu Elpídio ficou mais irado ainda. — Te dou enxada e ocê fica devendo a conta do delegado e a enxada pro riba. Não senhor. Vá plantar meu arroz já, já.
— Meu patrãozinho, mas plantar sem... — Elpídio o atalhou: — Vai-se embora, nego. E se fugir te boto soldado no seu rasto.
(ÉLIS, Bernardo. Melhores contos. 4. ed. São Paulo: Global, 2015. p. 58-59.)
O trabalhador Supriano foi chamado duas vezes de “nego” no Texto. Esse termo indica a herança da mão de obra escrava no Brasil e ressalta o racismo de Elpídio.
Sobre o trabalho escravo na produção agrícola da época colonial brasileira, assinale a alternativa correta:
O predomínio da utilização da mão de obra dos africanos escravizados na lavoura ocorreu, principalmente, porque gerava maior lucro aos comerciantes metropolitanos, inspirados pelas doutrinas mercantilistas.
A utilização da mão de obra africana no Brasil foi uma decorrência da conquista de grandes territórios por Portugal no continente africano e devido ao excesso populacional ali existente.
A decisão metropolitana de promover a escravidão dos povos da África ocorreu porque grandes reinos, como o de Angola, resistiram, desde o início, às tentativas de cristianização, praticando-se o que era chamado de “Guerra Justa”.
A metrópole optou pelo trabalho escravo com populações africanas no Brasil porque os árabes eram os principais responsáveis na promoção da guerra e na execução do tráfico, evitando-se que reinos cristãos se envolvessem com essa prática, considerada pecaminosa pela Igreja.