Texto 6
Carta 1ª (fragmentos)
Em que se descreve a entrada que fez Fanfarrão em Chile.
35 -- Não és tu, Doroteu, aquele mesmo
Que pedes que te diga se é verdade
O que se conta dos barbados monos
Que à mesa trazem os fumantes pratos?
Não desejas saber se há grandes peixes,
Não queres que te informe dos costumes
45 -- Dos incultos gentios? Não perguntas
Se entre eles há nações, que os beiços furam?
E outras que matam, com piedade falsa,
Escuta a história de um moderno chefe,
Que acaba de reger a nossa Chile,
Ilustre imitador a Sancho Pança.
E quem dissera, amigo, que podia
55 -- Gerar segundo Sancho a nossa Espanha!
Não cuides, Doroteu, que vou contar-te
Ora, pois, doce amigo, vou pintá-lo
Tem pesado semblante, a cor é baça,
75 -- O corpo de estatura um tanto esbelta,
Feições compridas e olhadura feia;
Tem grossas sobrancelhas, testa curta,
Nariz direito e grande, fala pouco
Em rouco, baixo som de mau falsete;
80 -- Sem ser velho, já tem cabelo ruço,
E cobre este defeito e fria calva
À força de polvilho, que lhe deita.
Ainda me parece que o estou vendo
No gordo rocinante escarranchado!
85 -- As longas calças pelo umbigo atadas,
Amarelo colete e sobretudo
Vestida uma vermelha e justa farda.
95 -- Se em Chile agora entrasses e se visses
Ser o rei dos peraltas quem governa?
Sobre o que se apresenta no fragmento de as Cartas Chilenas, de Tomás Antônio Gonzaga, assinale a alternativa CORRETA.
O livro Cartas Chilenas, uma espécie de romance epistolar, circulou anonimamente em Salvador, entre os anos de 1788 e 1789, narrando os excessos de Cunha Menezes, um grande imitador de Sancho Pança, o fiel escudeiro do diabo em o Auto da barca do inferno, de Gil Vicente.
No Texto 6, Critilo relata a Doroteu a chegada do novo governador, Cunha Menezes, conhecida autoridade mineira do século XIX. Nesse mesmo trecho, também se observa que Critilo faz críticas severas à figura do novo chefe, embora exalte a sua capacidade de ser imitador de Sancho Pança.
Nos fragmentos em questão, Critilo convida Doroteu para ouvir a história do moderno chefe, a quem se refere com ironia e depreciação, emitindo opiniões e impressões sobre a grosseira figura daquele que seria o Fanfarrão Minésio – e, por meio de vocativos e imperativos, Critilo tenta persuadir seu interlocutor sobre a verdade dos fatos que narra.
Nos Textos árcades de um modo geral, são perceptíveis a simplicidade da linguagem e o bucolismo, características comuns a essa escola literária, que não estão presentes no Texto 6, por esse ser um épico, que tem como principal objetivo apresentar um herói - o Fanfarrão - e um fato histórico - a chegada do governador ao Chile.
Nos fragmentos em análise, ficam evidentes as críticas diretas e objetivas ao sistema colonial do Brasil do século XVIII e à má administração de Cunha Menezes, que se comportava como um tirano por causa das suas arbitrariedades e atrocidades contra as pessoas e o poder público, o que o tornaria um antiexemplo para a política brasileira.