TEXTO 3
[1] Pois bem dissera o monge, numa das suas profecias: “Muito pasto e pouco rasto.”
Estava acontecendo, tal e qual São João Maria profetizara. Pasto havia, e muito, mas
rebanhos não existiam mais. Os tempos de carestia que ele havia predito haviam
chegado. E gente que o ouvira lançar o vaticínio ainda vivia, para comprovar as
[5] palavras do profeta. Fora-se a época das matanças diárias, do churrasco gordo
assando nas brasas. Agora o tempo era de fome: “Muito pasto e pouco rasto.”
Elias, nas suas falas, explicava os tabus alimentares, apontando quais os bichos
puros e quais os impuros. O homem não comia cobras nem sapos, mas podia comer a
carne do boi, do peixe, da ovelha e do porco. Também não se comia a carne do gato,
[10] do cachorro e do cavalo, mas podia-se comer a galinha, os animais de caça, de pelo ou
de pena. Não se comia, no entanto, a carne do corvo nem da raposa.
Ultimamente, dia a dia, o próprio Elias ia levantando as restrições. Difícil, cada vez
mais, o reabastecimento do reduto. As forças apertavam o cerco, e sair fora, para
arrebanhar o gado, era morte certa ou prisão. A fome começou a mandar no arraial. As
[15] roças se acabaram, os jagunços passavam sem qualquer comida, quase o dia inteiro, e
começaram a devorar os objetos de couro: as caronas, os correames e os pelegos.
Elias aboliu o tabu a respeito da carne de cavalos, de mulas e de cães.
Cavalo era que nem gente, assim também o cachorro e o gato. Mas fome era fome.
Primeiro foram sacrificados os muares. Cavalos e cães foram respeitados, a princípio,
[20] pois até nomes tinham; eram, mal comparando, iguais às pessoas.
SASSI, Guido Wilmar. Geração do deserto. 5ª. ed. Porto Alegre: Movimento, 2012, pp. 152 e 153.
Assinale a alternativa correta em relação à obra Geração do deserto, Guido Wilmar Sassi, e ao Texto 3.
Zeferina, mãe de Nenê, morreu lutando contra o dragão de ferro, o trem que transportava passageiros e carga.
Os monges São João Maria e José Maria, no intuito de que houvesse paz na região do Contestado, defendiam a República e se opunham à Monarquia.
Da leitura da obra e do texto, depreende-se que Elias foi um dos líderes dos caboclos, após a morte do monge José Maria.
A liderança dos monges passava de pai para filho. Dessa forma, o monge a que o texto se refere, São João Maria, substituiu José Maria, o pai.
Além da profecia encontrada no texto, o monge São João Maria profetizou outras, a saber: um burro de ferro que atravessaria os campos com gente dentro, que o mundo não chegaria ao ano 2000 e que uma praga de besouros destruiria a lavoura.