TEXTO 3
[1] A mãe de Zaíta, às vezes, chegava a pensar que o segundo filho tinha razão. Vinha
a vontade de aceitar o dinheiro que ele oferecia sempre, mas não queria compactuar com
a escolha dele. Orgulhosamente, não aceitava que ele contribuísse com nada em casa.
Estava, porém, chegando à conclusão de que trabalho como o dela não resolvia nada.
[5] Mas o que fazer? Se parasse, a fome viria mais rápida e voraz ainda. Benícia, ao dar por
falta das meninas, interrompeu os pensamentos. Não ouvia as vozes das duas há algum
tempo. Deviam estar metidas em alguma arte. Sentiu certo temor. Veio andando aflita da
cozinha e tropeçou nos brinquedos esparramados pelo chão. A preocupação anterior se
transformou em raiva. Que merda! Todos os dias tinha que falar a mesma coisa! Onde as
[10] duas haviam se metido? Por que tinham deixado tudo espalhado? Apanhou a boneca
negra, a mais bonitinha, a que só faltava um braço, e arrancou o outro, depois a cabeça e
as pernas. Em poucos minutos a boneca estava destruída; cabelos arrancados e olhos
vazados. A outra menina, Naíta, que estava no barraco ao lado, escutando os berros da
mãe, voltou aflita. Foi recebida com tapas e safanões. Saiu chorando para procurar Zaíta.
[15] Tinha duas tristezas para contar a sua irmã igual. Havia perdido uma coisa que Zaíta
gostava muito. De manhã tinha apanhado a figurinha debaixo do travesseiro. Queria sentir
o perfume de perto. E agora não sabia mais onde estava a flor... A outra coisa era que a
mamãe estava brava porque os brinquedos estavam largados no chão e de raiva ela
havia arrebentado aquela bonequinha negra, a mais linda...
EVARISTO, Conceição. Olhos d’água. Ed. Pallas, Rio de Janeiro, 2015, pp. 75/76.
Analise as proposições em relação à obra Olhos d’água, Conceição Evaristo, e ao Texto 3.
I. Na oração “Mas o que fazer” (linha 5) há o pressuposto das dificuldades dos laços afetivos familiares, dos conflitos internos, das reflexões, procurando humanizar quem a sociedade busca desumanizar.
II. A narrativa da autora traz uma ficção densa, embora em um estilo evidenciado pelo uso de uma linguagem poética que, muitas vezes, transcende a prosa.
III. A leitura da estrutura “Em poucos minutos a boneca estava destruída” (linha 12) leva o leitor a inferir uma correlação ao ocorrido com a menina Zaíta, no final do conto.
IV. A leitura do conto leva o leitor a constatar a inocência infantil ante o perigo, pois não o identifica, ignora-o, seguindo o que se tinha determinado a alcançar, a exemplo, a personagem Zaíta.
V. Da leitura da estrutura, “mas não queria compactuar com a escolha dele” (linhas 2 e 3) infere-se que a mãe não sentia orgulho pela escolha de vida que o segundo filho fizera, ela o aceitava como filho, mas repudiava as atividades que ele realizava.
Assinale a alternativa correta.
Somente as afirmativas II e III são verdadeiras.
Somente as afirmativas I, II e IV são verdadeiras.
Somente as afirmativas II, III e V são verdadeiras.
Somente as afirmativas I, IV e V são verdadeiras.
Todas as afirmativas são verdadeiras.