TEXTO 2
Para Viver Um Grande Amor
Vinicius de Moraes
Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso —
para viver um grande amor.
Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de
colher... — não tem nenhum valor.
Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrarse
cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja
lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausurese
a mulher amada e postarse
de fora
com uma espada — para viver um grande amor.
Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer
sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja
apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor.
Para viver um amor, na realidade, há que compenetrarse
da verdade de que não existe amor sem
fidelidade — para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da
liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.
Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô — para
viver um grande amor.
Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito
— peito de remador. É preciso olhar sempre a bemamada
como a sua primeira namorada e sua viúva
também, amortalhada no seu finado amor.
É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista!
— para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de
amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...
Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas
para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma
rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?
Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só
defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também
com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem
cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um
grande amor.
É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao dizquedizque
— que não quer nada com o amor.
Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva escura e desvairada não se souber achar a bemamada
— para viver um grande amor.
Veja o Soneto do importante poeta português, Luís de Camões, e responda oque se pede
Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente,
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer,
é um andar solitário entre a gente,
é nunca contentarse
de contente,
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade,
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor,
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
O pensamento camoniano, mesmo tratando do mesmo assunto que o texto de Vinicius, apresenta visão totalmente diferenciada.
O segundo quarteto é o que mais se distancia da ideia expressa no texto 2.
O primeiro terceto camoniano afirma que o amor prende e escraviza, devese portanto, ficar atento para não morrer por este sentimento.
Os dois textos mostram toda a instabilidade e devoção vivenciadas quando se ama.
Ambos os textos apresentam poucos recursos estilísticos, suas leituras e compreensões são fluídicas e denotativas.