Texto 1
Sensibilidades
FARIA, Luiz Antônio de. Nov. 2020.
Tomo I
As palavras faladas
Nasceram de rosnados e grunhidos,
E gritos melódicos e gemidos...
De dor e prazer na luta e na paz.
As sinfonias das palavras faladas
Vivas e ao vivo,
Às coreografias gestuais somadas,
Eram indícios
De impulsos, ações, reações, intenções,
Produtos das ‘sensibilidades’
E do culto a mitos e divindades,
De pais para filhos e todos da tribo.
Os pais temiam a morte,
Pois viram os mortos
E o viver deles no tempo
Ia ao encontro da fatalidade final
Até que morriam e ainda é assim.
Por isso,
Os pais se dedicaram ensinar regras aos filhos
De tudo e como
Se alimentar, se proteger,
Se agrupar, se procriar,
E conviver.
Foi quando começou a educação.
Mas as palavras faladas
Ou as vivências dos pais
Não eram suficientes
E ainda não.
Tomo II
Na certeza da morte,
Os pais fizeram os ícones imortais,
Parietais em cavernas,
Tábuas de pedras ou paus,
E nas peles de animais.
Eram imagens atraentes...
E as necessidades dos leitores
Por mensagens grafadas eram tantas,
Que os gigantescos desenhos
Ficaram demorados de se fazer,
Na escassez de recursos, espaço e tempo.
Então fizeram símbolos,
Convenções passíveis de significados.
E mesmo assim,
Não foram suficientes!
A Pré-História da humanidade
Chegava ao fim!
Tomo III
Na ambição dos poderes,
Inventaram o trabalho, a servidão:
Usavam o saber, a força, o suor e a beleza
Dos dominados
A gerar riquezas, conforto e prazeres
Aos dominantes.
Reduziram figuras e símbolos
Às letras, palavras escritas e numerais.
Qualificaram e quantificaram valores
E formaram textos escritos
Com calamos de juncos,
Em placas de argila, couros, paus e pedras.
Era por volta do milênio IV a. C..
Os séculos se foram e chegaram os filósofos
Preceptores dos filhos dos nobres.
E escreveram nos pergaminhos,
Criaram escolas, livros e bibliotecas.
Tomo IV
Lembram-se
Das regras, mitos e divindades da Pré-História?
Perderam a utilidade para as ciências...
“(das ciências, Deus meu, das ciências!)
Das ciências, das artes, da civilização...!”
Mas nos limites das ciências,
Quando intempéries e pestes matam,
Há os que fazem preces a Deus.
Sempre foi assim, não foi?
As ciências, meu Deus,
Meios vitais ou mortais,
Ficam reféns das políticas
De grupos, castas e classes sociais,
Trancadas em cofres,
Sob as ordens dos mandantes
E da lógica do juízo dos obedientes.
Mas na escassez do espaço e do tempo,
As bibliotecas ficaram inacessíveis
E inúteis aos povos dominados,
Que sobrevivem de trocar
Direitos, ideias, saúde, beleza e suor...
Por pão, pano, paz e pobreza apenas,
Por força da lei da oferta e da procura.
E o problema das palavras não se resolveu!
Porque as faladas e escritas
São representações,
As figuras também
E muito mais os “grandes” textos.
Tomo V
Indaguei:
– “Mundo mundo vasto mundo”,
Se de Vós eu tivesse todas as informações,
Seria eu a pessoa mais poderosa do mundo?
E ele me respondeu:
– De nada adianta essa ilusão,
Nenhuma solução!
À sua disposição, todas elas estão.
O que lhe cobram é o conhecimento,
É o saber muito e tanto... e tanto,
Vindo de seleções, exames e experimentos muitos,
Com isto ou aquilo,
Capazes de aquecer cabeças até queimar dendritos!
Nesse entremeio,
É que foi instalada a velha questão
Da falta de recurso, espaço, saber e tempo,
Em que a tecnologia antiga evoluiu:
O dono do recurso e do espaço
Ordena a competência
E o hábil artesão aplica o saber.
Foi quando nasceram as profissões
Cada qual a professar sua sensibilidade.
Mas isso não foi solução
E vieram especialidades na ação:
Habilidades aplicadas com tecnologia.
E o que esta fez...
E faz na contemporaneidade?
Diferenças dos poderes,
Exige muito recurso
E pouco espaço e tempo,
Ajuda na transmissão de códigos
A serem decifrados sim!
Mas distancia e despersonaliza as pessoas,
Além de transformá-las
Em sensações falsificadas
De imagens e sons, apenas,
Arquivos passíveis de investigação!
A tecnologia na servidão à política neoliberal
Decepa das pessoas a identidade
Na representação codificada
Do Cadastro de Pessoa Física,
Dos títulos profissionais e etiquetas sociais,
A exigir delas nova leitura a cada dia!
Então,
Leitura é percepção de partes manifestas
De fenômenos, pessoas, outros seres e códigos
Que transmuta tais partes configuradas
Em sentimentos, sensações, ideias, memórias,
Sentidos e significados,
Jamais nos próprios
Fenômenos, pessoas, outros seres...
Melhor:
Escreva seu nome abaixo dessa sua fotografia
Com fundo de Sol poente...
Escreveu... agora leia...
Leu?
Por tanto, afirme, com absoluta certeza:
“Aqui não estão nem o por do Sol nem eu”!
Leitura, esta é,
Há séculos e séculos,
Mascarada pelas culturas!
Então, figuras e palavras dos textos, nos discursos,
Extraídos dos contextos das culturas
Parecem com as verdades
Ou são mentiras!
Fica o desafio de entender os discursos
Camuflado entre gestos, figuras e palavras,
Em diferentes visões de mundo.
Tomo VI
É ingenuidade
Acreditar... sem meditar,
Em qualquer texto escrito ou falado,
Em qualquer figura estática ou dinâmica!
A seleção é fundamental.
Percebem o perigo?
As figuras e as palavras foram e são
Uma das maiores invenções humanas,
Exponencialmente poderosas,
Extremamente necessárias,
Exatamente imperfeitas!
Vindas dos contextos das culturas
Para os discursos...
Reúnem e dispersam, libertam e escravizam
As pessoas, meu Deus!
Vestem ou retiram máscaras de verdades
De ideias e sentimentos!
Sentenciam a vida e a morte
Das pessoas, meu Deus!
E o mais repugnante e horroroso de tudo:
Todos esses absurdos,
Também em Vosso Nome, meu Deus!
Tomo VII
Indagam meios de ser feliz?
A pessoa ‘supersensível’
Aos estímulos aos sentidos e emoções,
Na seleção e análise do mundo,
Das figuras e do texto,
Na compreensão do contexto,
Da cultura e do discurso
Talvez saiba.
Mas o problema permanece,
Porque ‘supersensível’
É característica perceptível na pessoa
E ‘supersensibilidade’ é parte intransferível dela!
As linguagens não são o mundo.
Representam caracteres de partes dele,
Semelhantes às ciências,
Às verdades, axiomas e mitos...
Acerca dele!
Apesar de tudo,
Diz a pessoa supersensível:
“Estar sensível ao mundo e às linguagens
É almejar a supersensibilidade”.
Ai... linguagens,
Misteriosas potências são as vossas!
Texto 2
Comunicação (Retrato natural, 1949)
Cecília Meireles
Pequena lagartixa branca,
ó noiva brusca dos ladrilhos!
sobe à minha mesa, descansa,
debruça-te em meus calmos livros.
Ouve comigo a voz dos poetas
que agora não dizem mais nada,
– e diziam coisas tão belas! –
ó ídolo de cinza e prata!
Ó breve deusa de silêncio
que na face da noite corres
como a dor pelo pensamento,
– e sozinha miras e foges.
Pequena lagartixa – vinda
para quê? – pousa em mim teus olhos.
Quero contemplar tua vida,
a repetição dos teus mortos.
Como os poetas que já cantaram,
e que já ninguém mais escuta,
eu sou também a sombra vaga
de alguma interminável música!
Para em meu coração deserto!
Deixa que te ame, ó alheia, ó esquiva…
Sobre a torrente do universo,
nas pontes frágeis da poesia.
Texto 3
O mosquito (Nova antologia poética, 2006)
Vinícius de Moraes
Parece mentira
De tão esquisito:
Mas sobre o papel
O feio mosquito
Fez sombra de lira!
Analise as 10 afirmações a seguir, que tratam dos textos 1, 2 e 3.
Os três textos
1. estão em forma de poemas, mas não evidenciam características de poesias.
2. são produções literárias do século XX.
3. restringem-se ao uso da 2ª pessoa do singular em seus vocativos.
4. abordam problemáticas da existência humana, ou seja, são existencialistas.
5. discorrem acerca das relações intrínsecas e extrínsecas aos seres no e com o mundo, em seus âmbitos concretos e abstratos.
6. exploram a complexidade da vida humana quanto a valores e culturas.
7. utilizam metalinguagem.
8. são líricos.
9. são dramáticos.
10. são épicos.
A alternativa onde estão todos os números das afirmações incorretas é:
2, 4, 5 e 7.
1, 6, 7, 8 e 9.
1, 2, 3, 9 e 10.
4, 5, 6, 7, 8 e 9.
2, 3, 4, 5, 9 e 10.