UPE SSA 2019

Texto 1


O Conde e o Passarinho
Rubem Braga

 

(1) Acontece que o Conde Matarazzo estava passeando pelo parque. O Conde Matarazzo é um Conde muito velho, que tem muitas fábricas. Tem também muitas honras. Uma delas consiste em uma preciosa medalhinha de ouro que o Conde exibia à lapela, amarrada a uma fitinha. Era uma condecoração (sem trocadilho).

 

(2) Ora, aconteceu também um passarinho. No parque havia um passarinho. E esses dois personagens – o Conde e o passarinho – foram os únicos da singular história narrada pelo Diário de São Paulo.

 

(3) Devo confessar preliminarmente que, entre um Conde e um passarinho, prefiro um passarinho. Torço pelo passarinho. Não é por nada. Nem sei mesmo explicar essa preferência. Afinal de contas, um passarinho canta e voa. O Conde não sabe gorjear nem voar. O Conde gorjeia com apitos de usinas, barulheiras enormes, de fábricas espalhadas pelo Brasil, vozes dos operários, dos teares, das máquinas de aço e de carne que trabalham para o Conde. O Conde gorjeia com o dinheiro que entra e sai de seus cofres, o Conde é um industrial, e o Conde é Conde porque é industrial. O passarinho não é industrial, não é Conde, não tem fábricas. Tem um ninho, sabe cantar, sabe voar, é apenas um passarinho e isso é gentil, ser um passarinho. Eu quisera ser um passarinho. Não, um passarinho, não. Uma ave maior, mais triste. Eu quisera ser um urubu.

 

(4) Entretanto, eu não quisera ser Conde. A minha vida sempre foi orientada pelo fato de eu não pretender ser Conde. Não amo os Condes. Também não amo os industriais. Que eu amo? Pierina e pouco mais. Pierina e a vida, duas coisas que se confundem hoje, e amanhã mais se confundirão na morte. (...) Quando poderás ser um urubu, meu velho Rubem?

 

(5) Mas voltemos ao Conde e ao passarinho. Ora, o Conde estava passeando e veio o passarinho. O Conde desejou ser que nem o seu patrício, o outro Francisco, o Francisco da Umbria, para conversar com o passarinho. Mas não era aquele, o São Francisco de Assis, era apenas o Conde Francisco Matarazzo. Porém, ficou encantado ao reparar que o passarinho voava para ele. O Conde ergueu as mãos feito uma criança, feito um santo. Mas não eram mãos de criança nem de santo, eram mãos de Conde industrial. O passarinho desviou e se dirigiu firme para o peito do Conde. Ia bicar seu coração? Não, ele não era um bicho grande de bico forte, não era, por exemplo, um urubu, era apenas um passarinho. Bicou a fitinha, puxou, saiu voando com a fitinha e com a medalha.

 

(6) O Conde ficou muito aborrecido, achou muita graça. Ora essa! Que passarinho mais esquisito!

 

(7) Isso foi o que o Diário de São Paulo contou. O passarinho, a esta hora assim, está voando, com a medalhinha no bico. Em que peito a colocareis, irmão passarinho? Voai, voai, voai por entre as chaminés do Conde, varando as fábricas do Conde, sobre as máquinas de carne que trabalham para o Conde, voai, voai, voai, voai, passarinho, voai.

Disponível em: https://rubem.wordpress.com/grandes-cronicas-brasileiras/ Acesso em: 15 jul. 2018. Adaptado.

 

Texto 2


Pierina e pouco mais
Henrique Fendrich

 

Como já é bastante comum que eu folheie algum livro e, sem querer, logo me depare com alguma citação ao Rubem Braga, não estranhei que justamente nos dias em que estive em São Paulo, vindo de Taubaté, houvesse uma exposição sobre ele no Museu da Língua Portuguesa. É uma lei de atração que provavelmente apenas a mecânica quântica consegue explicar. Ou ela ou o fato de que na última década li, reli e treli todos os seus livros, pesquisei e esmiucei todas as características de suas crônicas (...).

 

Não era, portanto, um desconhecido que fui encontrar no museu. E por isso também não esperava encontrar muita novidade. Pra mim já era bom ver o Braga sendo visto – pelo menos no ano do seu centenário. E lá estava o Braga repórter, escritor, editor, diplomata, cachoeirense, amante das artes, homem da TV e, sobretudo, combatente da FEB. (...)

 

Tudo isso exposto aqui em São Paulo, onde o Braga se sentiria bem. Ele dizia que Congonhas já havia entrado para a sua geografia. Nesta soberba cidade, os seus nervos estalaram, entre emoções e solidões, como vergas de metal do velho viaduto. Dentro dele vibravam, como parte de sua vida, as agitações da ânsia multifária e triste de São Paulo. (...) E há também Pierina, a amada que vez ou outra aparecia em sua crônica no Diário de São Paulo em 1934. Pierina existiu e se chamava Pierina. Com ela Braga se correspondia por meio de sinais e gestos da janela do seu prédio para a janela do sobrado dela. Às vezes, lhe jogava flores ou frutas, sem acertar o alvo. Nunca chegaram a se encontrar, e logo o Braga se mudou de São Paulo. Mas, naquele tempo, o que amava o Braga? Pierina e pouco mais. Pierina e a vida, duas coisas que se confundem hoje, e amanhã mais se confundirão na morte.

Disponível em: https://rubem.wordpress.com/2013/07/26/pierina-e-pouco-mais/ Acesso em: 25 abr. 2018. Adaptado.

 

Acerca do Texto 2, de seus recursos expressivos e de suas relações com o Texto 1, analise as afirmativas a seguir.

 

1. As semelhanças entre o Texto 2 e o Texto 1 limitam-se ao fato de o autor do primeiro ser tema do segundo; já o segundo, por apresentar um narrador que fala de fora do texto, não constitui uma crônica, mas um relato.
2. Quando esclarece quem é Pierina, personagem citada no texto de Rubem Braga, o autor do Texto 2 amplia a capacidade de o leitor compreender o Texto 1.
3. Ao incorporar ao seu texto parte da crônica de Braga (Mas, naquele tempo, o que amava o Braga? Pierina e pouco mais. Pierina e a vida, duas coisas que se confundem hoje, e amanhã mais se confundirão na morte.) (3º parágrafo), Fendrich rememora o seu autor preferido e ratifica as palavras de Braga sobre o amor, a vida e a morte.
4. O emprego da intertextualidade no Texto 2 não se mostrou eficaz porque Fendrich não conseguiu integrar totalmente a voz de Rubem Braga à sua própria voz, em razão da diferença de temas entre os textos.

 

Estão CORRETAS:

a

1 e 2, apenas.

b

1 e 4, apenas.

c

2 e 3, apenas.

d

2, 3 e 4, apenas.

e

1, 2, 3 e 4.

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C
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