UERJ 2012/2

Sobre a origem da poesia

 

A origem da poesia se confunde com a origem da própria linguagem.

Talvez fizesse mais sentido perguntar quando a linguagem verbal deixou de ser poesia. Ou: qual

a origem do discurso não poético, já que, restituindo laços mais íntimos entre os signos e as

coisas por eles designadas, a poesia aponta para um uso muito primário da linguagem, que

[5]  parece anterior ao perfil de sua ocorrência nas conversas, nos jornais, nas aulas, conferências,

discussões, discursos, ensaios ou telefonemas.

Como se ela restituísse, através de um uso específico da língua, a integridade entre nome e coisa

− que o tempo e as culturas do homem civilizado trataram de separar no decorrer da história.

A manifestação do que chamamos de poesia hoje nos sugere mínimos flashbacks de uma possível

[10]  infância da linguagem, antes que a representação rompesse seu cordão umbilical, gerando

essas duas metades − significante e significado.

Houve esse tempo? Quando não havia poesia porque a poesia estava em tudo o que se dizia?

Quando o nome da coisa era algo que fazia parte dela, assim como sua cor, seu tamanho, seu

peso? Quando os laços entre os sentidos ainda não se haviam desfeito, então música, poesia,

[15]  pensamento, dança, imagem, cheiro, sabor, consistência se conjugavam em experiências

integrais, associadas a utilidades práticas, mágicas, curativas, religiosas, sexuais, guerreiras?

Pode ser que essas suposições tenham algo de utópico, projetado sobre um passado pré-babélico,

tribal, primitivo. Ao mesmo tempo, cada novo poema do futuro que o presente alcança cria, com

sua ocorrência, um pouco desse passado.

[20]  Lembro-me de ter lido, certa vez, um comentário de Décio Pignatari, em que ele chamava a

atenção para o fato de, tanto em chinês como em tupi, não existir o verbo ser, enquanto verbo de

ligação. Assim, o ser das coisas ditas se manifestaria nelas próprias (substantivos), não numa

partícula verbal externa a elas, o que faria delas línguas poéticas por natureza, mais propensas

à composição analógica.

[25]  Mais perto do senso comum, podemos atentar para como colocam os índios americanos falando,

na maioria dos filmes de cowboy − eles dizem “maçã vermelha”, “água boa”, “cavalo veloz”; em

vez de “a maçã é vermelha”, “essa água é boa”, “aquele cavalo é veloz”. Essa forma mais sintética,

telegráfica, aproxima os nomes da própria existência − como se a fala não estivesse se referindo

àquelas coisas, e sim apresentando-as (ao mesmo tempo em que se apresenta).

[30]  No seu estado de língua, no dicionário, as palavras intermedeiam nossa relação com as coisas,

impedindo nosso contato direto com elas. A linguagem poética inverte essa relação, pois, vindo a

se tornar, ela em si, coisa, oferece uma via de acesso sensível mais direto entre nós e o mundo.

(...)

Já perdemos a inocência de uma linguagem plena assim. As palavras se desapegaram das coisas,

assim como os olhos se desapegaram dos ouvidos, ou como a criação se desapegou da vida. Mas

temos esses pequenos oásis − os poemas − contaminando o deserto da referencialidade.

ARNALDO ANTUNES www.arnaldoantunes.com.br

No último parágrafo (linhas 33 a 35), o autor se refere à plenitude da linguagem poética, fazendo, em seguida, uma descrição que corresponde à linguagem não poética, ou seja, à linguagem referencial.
 
Pela descrição apresentada, a linguagem referencial teria, em sua origem, o seguinte traço fundamental:

a

o desgaste da intuição

b

a dissolução da memória

c

a fragmentação da experiência

d

o enfraquecimento da percepção

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C
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