ENEM 2009 (prova vazada)

Sentimental
  Ponho-me a escrever teu nome com
  letras de macarrão.
  No prato, a sopa esfria, cheia de escamas
  e debruçados na mesa todos contemplam
  esse romântico trabalho.
  
  Desgraçadamente falta uma letra,
  uma letra somente
  para acabar teu nome!
  
  — Está sonhando? Olhe que a sopa esfria!
  
  Eu estava sonhando...
  E há em todas as consciências este cartaz amarelo:
  "Neste pais é proibido sonhar."
ANDRADE, C. D. Seleta em Prosa e Verso. Rio de Janeiro: Record, 1995.
Com base na leitura do poema, a respeito do uso e da predominância das funções da linguagem no texto de Drummond, pode-se afirmar que
a

por meio dos versos "Ponho-me a escrever teu nome" (v.1) e "esse romântico trabalho" (v.5), o poeta faz referências ao seu próprio ofício: o gesto de escrever poemas líricos.

b

a linguagem essencialmente poética que constitui os versos "No prato, a sopa esfria, cheia de escamas e debruçados na mesa todos contemplam" (v.3 e 4) confere ao poema uma atmosfera irreal e impede o leitor de reconhecer no texto dados constitutivos de uma cena realista.

c

na primeira estrofe, o poeta constrói uma linguagem centrada na amada, receptora da mensagem, mas, na segunda, ele deixa de se dirigir a ela e passa a exprimir o que sente.

d

em "Eu estava sonhando..." (v. 10), o poeta demonstra que está mais preocupado em responder à pergunta feita anteriormente e, assim, dar continuidade ao diálogo com seus interlocutores do que em expressar algo sobre si mesmo.

e

no verso "Neste país é proibido sonhar." (v.12), o poeta abandona a linguagem poética para fazer uso da função referencial, informando sobre o conteúdo do "cartaz amarelo" (v.11) presente no local.

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Resposta
A
Tempo médio
2 min

Resolução

Análise Detalhada da Questão

A questão pede para analisar o uso e a predominância das funções da linguagem no poema "Sentimental" de Carlos Drummond de Andrade. Para isso, devemos ler o poema atentamente e avaliar cada alternativa à luz da teoria das funções da linguagem.

1. Leitura e Interpretação do Poema:

  • O eu lírico descreve uma cena cotidiana (sopa esfriando) com uma ação inusitada e "romântica": escrever o nome da pessoa amada com letras de macarrão.
  • Há uma frustração: falta uma letra para completar o nome.
  • Uma voz externa interrompe, trazendo o eu lírico de volta à realidade ("Está sonhando? Olhe que a sopa esfria!").
  • O eu lírico confirma que estava sonhando.
  • O poema termina com uma reflexão amarga sobre a proibição do sonho ("Neste país é proibido sonhar."), simbolizada por um "cartaz amarelo" na consciência coletiva.

2. Análise das Funções da Linguagem no Poema:

  • Função Emotiva/Expressiva: Predomina, pois o poema centra-se nos sentimentos, na subjetividade e no estado de espírito do eu lírico (o ato romântico, a frustração, o sonho, a desilusão final). Ex: "Ponho-me a escrever", "Desgraçadamente", "Eu estava sonhando...".
  • Função Poética: Evidente na construção das imagens ("letras de macarrão", "sopa cheia de escamas"), no ritmo, na escolha das palavras e na exploração da linguagem de forma estética e simbólica.
  • Função Referencial: Presente na descrição da cena (sopa, prato, mesa), mas subordinada às outras funções.
  • Função Conativa: Aparece sutilmente no direcionamento à pessoa amada ("teu nome") e na interpelação ("Está sonhando?").
  • Função Metalinguística: Discutível, mas pode ser vista na reflexão sobre o ato de "escrever" (mesmo que com macarrão) e na menção à falta de uma "letra".
  • Função Fática: Presente no diálogo que testa o canal de comunicação ("Está sonhando?").

3. Avaliação das Alternativas:

  • A: Sugere que o ato de escrever o nome com macarrão é uma metáfora para o fazer poético lírico. "Ponho-me a escrever teu nome" e "esse romântico trabalho" podem ser lidos nesse sentido metalinguístico/poético, onde o poeta reflete sobre seu próprio ofício de forma lírica e sentimental. Esta interpretação é consistente com a obra de Drummond e a natureza do poema.
  • B: Afirma que a linguagem poética impede o reconhecimento de uma cena realista. Isso é incorreto. A cena base (sopa, mesa) é realista, embora a ação e algumas descrições ("cheia de escamas") sejam poéticas e surreais, elas não anulam o fundo realista, mas o transformam poeticamente.
  • C: Diz que a 1ª estrofe foca na amada (receptora) e a 2ª no eu lírico. Na verdade, a 1ª estrofe já é centrada na ação e sentimento do eu lírico ao escrever o nome. A 2ª estrofe continua essa centralidade, expressando frustração e o estado de sonho. Não há uma mudança tão marcada de foco no receptor para o emissor.
  • D: Alega que "Eu estava sonhando..." visa mais continuar o diálogo (função fática) do que expressar algo pessoal (função emotiva). Pelo contrário, essa frase é uma confissão íntima, revelando o estado de espírito e a fuga da realidade do eu lírico, sendo fortemente emotiva.
  • E: Afirma que o último verso abandona a linguagem poética pela referencial ao informar sobre o cartaz. Embora o verso cite o conteúdo de um aviso, a ideia de um "cartaz amarelo" na "consciência" de todos e a frase "Neste país é proibido sonhar" são altamente simbólicas e poéticas, carregadas de crítica social e desilusão, extrapolando a mera função referencial.

4. Conclusão:

A alternativa A oferece a interpretação mais adequada sobre uma das possíveis camadas de significado do poema relacionada às funções da linguagem. Ela reconhece a dimensão metalinguística e poética, onde o ato descrito metaforiza o próprio fazer poético lírico, uma característica da poesia moderna. As demais alternativas apresentam leituras equivocadas ou parciais das funções da linguagem no texto.

Portanto, a alternativa correta é a A.

Dicas

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Pense sobre o que significa "escrever" no contexto de um poema. Pode haver mais de um significado?
Considere as diferentes intenções por trás da linguagem: informar, emocionar, embelezar, interagir, explicar a própria linguagem.
Analise o último verso: ele é apenas uma informação ou carrega um significado mais profundo e simbólico no contexto do poema?

Erros Comuns

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Interpretar a cena do macarrão de forma estritamente literal, sem perceber a possível metáfora com o fazer poético.
Confundir a presença de elementos realistas com a ausência da função poética, ou vice-versa (erro abordado na alternativa B).
Analisar as funções de forma isolada em cada estrofe, sem perceber a predominância ou a interação delas ao longo do poema (erro relacionado à alternativa C).
Superestimar a função fática em detrimento da função emotiva em trechos de diálogo que revelam estados interiores (erro abordado na alternativa D).
Achar que uma frase com conteúdo informativo ou de citação perde automaticamente sua função poética ou emotiva, especialmente em um contexto literário (erro abordado na alternativa E).
Revisão

Revisão de Conceitos: Funções da Linguagem

As funções da linguagem, propostas por Roman Jakobson, descrevem os diferentes propósitos ou ênfases que a linguagem pode ter em um ato de comunicação, dependendo do foco em um dos elementos da comunicação (emissor, receptor, mensagem, código, canal, contexto):

  • Função Emotiva ou Expressiva: Foco no emissor. Expressa sentimentos, emoções, opiniões. Uso de interjeições, exclamações, 1ª pessoa.
  • Função Conativa ou Apelativa: Foco no receptor. Busca influenciar, persuadir, dar ordens. Uso de vocativos, imperativos, 2ª ou 3ª pessoa (tratamento).
  • Função Poética: Foco na mensagem. Preocupação com a forma, a estética, a sonoridade, o ritmo, as figuras de linguagem. Explora a plurissignificação das palavras. Comum em textos literários e publicitários.
  • Função Referencial ou Denotativa: Foco no contexto ou referente. Busca informar de maneira objetiva, clara e direta. Linguagem denotativa, 3ª pessoa. Comum em notícias, textos científicos.
  • Função Metalinguística: Foco no código. A linguagem fala sobre si mesma. Definições, explicações sobre palavras ou a própria língua. Dicionários, gramáticas, ou poemas que falam sobre o fazer poético.
  • Função Fática: Foco no canal. Testa ou mantém o canal de comunicação aberto. Cumprimentos, interjeições de teste ("Alô?", "Entende?"), frases para prolongar a conversa.

É importante notar que em um mesmo texto, várias funções podem coexistir, mas geralmente uma delas predomina.

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