ENEM 2010 segunda aplicação
Quando Édipo nasceu, seus pais, Laio e Jocasta, os reis de Tebas, foram informados de uma profecia na qual o filho mataria o pai e se casaria com a mãe. Para evitá-la, ordenaram a um criado que matasse o menino. Porém, penalizado com a sorte de Édipo, ele o entregou a um casal de camponeses que morava longe de Tebas para que o criasse. Édipo soube da profecia quando se tornou adulto. Saiu então da casa de seus pais para evitar a tragédia. Eis que, perambulando pelos caminhos da Grécia, encontrou-se com Laio e seu séquito, que, insolentemente, ordenou que saísse da estrada. Édipo reagiu e matou todos os integrantes do grupo, sem saber que entre eles estava seu verdadeiro pai. Continuou a viagem até chegar a Tebas, dominada por uma Esfinge. Ela decifrou o enigma da Esfinge, tornou-se rei de Tebas e casou-se com a rainha, Jocasta, a mãe que desconhecia.
Disponível em: http://www.culturabrasil.org. Acesso em: 28 ago. 2010 (adaptado).
No mito Édipo Rei, são dignos de destaque os temas do destino e do determinismo. Ambos são características do mito grego e abordam a relação entre liberdade humana e providência divina. A expressão filosófica que toma como pressuposta a tese do determinismo é:
“Nasci para satisfazer a grande necessidade que eu tinha de mim mesmo.” Jean Paul Sartre
“Ter fé é assinar uma folha em branco e deixar que Deus nela escreva o que quiser.” Santo Agostinho
“Quem não tem medo da vida também não tem medo da morte.” Arthur Schopenhauer
“Não me pergunte quem sou eu e não me diga para permanecer o mesmo.” Michel Foucault
“O homem, em seu orgulho, criou a Deus a sua imagem e semelhança.” Friedrich Nietzsche
Resolução
A questão pede para identificar, entre as citações filosóficas apresentadas, aquela que expressa a tese do determinismo, conceito central no mito de Édipo Rei resumido no texto.
1. Compreensão do Mito e do Conceito Central: O texto narra a história de Édipo, cuja vida é marcada por uma profecia (destino) de que ele mataria o pai e se casaria com a mãe. Todas as tentativas de evitar esse destino (a ordem para matá-lo, sua entrega a pais adotivos, sua fuga de casa ao saber da profecia) acabam, ironicamente, por conduzir à sua realização. Isso ilustra a ideia de um destino inescapável, onde os eventos são predeterminados e a liberdade humana é limitada ou inexistente diante da providência divina ou do fado. Este é o cerne do determinismo no contexto do mito.
2. Definição de Determinismo: Em filosofia, determinismo é a tese de que todos os eventos, incluindo as ações e escolhas humanas, são causalmente determinados por eventos anteriores em conjunção com as leis da natureza. Em um contexto teológico, como o sugerido pela relação entre liberdade humana e "providência divina" mencionada no enunciado, o determinismo pode se manifestar como predestinação, a crença de que Deus (ou o destino, no caso grego) preordenou todos os acontecimentos.
3. Análise das Alternativas:
- A (Sartre): A frase "Nasci para satisfazer a grande necessidade que eu tinha de mim mesmo" é uma expressão do existencialismo de Sartre, que defende a liberdade radical e a auto-criação. O indivíduo define sua própria essência através de suas escolhas. É o oposto do determinismo.
- B (Santo Agostinho): A frase "Ter fé é assinar uma folha em branco e deixar que Deus nela escreva o que quiser" expressa uma submissão total à vontade divina. Sugere que o curso da vida é determinado por Deus, alinhando-se perfeitamente com a ideia de determinismo teológico ou predestinação, que é análoga ao destino inescapável do mito grego. A fé implica aceitar esse plano divino preestabelecido.
- C (Schopenhauer): A frase "Quem não tem medo da vida também não tem medo da morte" aborda a atitude perante a existência, ligada ao pessimismo schopenhaueriano, mas não foca diretamente na questão do determinismo versus livre-arbítrio de forma tão clara quanto a alternativa B.
- D (Foucault): A frase "Não me pergunte quem sou eu e não me diga para permanecer o mesmo" reflete a visão de Foucault sobre a identidade como algo fluido e construído, resistindo a categorizações fixas impostas pelo poder. Não aborda o determinismo causal ou divino.
- E (Nietzsche): A frase "O homem, em seu orgulho, criou a Deus a sua imagem e semelhança" é uma crítica à religião e à concepção antropomórfica de Deus. Relaciona-se ao ateísmo e à crítica da moralidade tradicional, não ao determinismo.
4. Conclusão: A citação de Santo Agostinho (Alternativa B) é a que melhor representa a tese do determinismo, especificamente na sua forma teológica (predestinação), onde a vida humana é vista como seguindo um roteiro escrito por uma força superior (Deus), assim como a vida de Édipo foi regida pelo destino/profecia.
Portanto, a alternativa correta é a B.
Dicas
Erros Comuns
Revisão de Conceitos
- Mito Grego: Narrativas tradicionais que explicam a origem do mundo, fenômenos naturais, ou aspectos da condição humana, frequentemente envolvendo deuses e heróis. O destino (moira) é um tema recorrente, muitas vezes visto como uma força superior aos próprios deuses.
- Destino e Determinismo: No contexto do mito de Édipo, o destino é uma força predeterminada que rege os acontecimentos da vida, independentemente das tentativas humanas de evitá-lo. Isso se assemelha ao conceito filosófico de determinismo, a visão de que todos os eventos são necessitados por causas antecedentes e condições, juntamente com as leis da natureza.
- Providência Divina: A crença, especialmente em teologias monoteístas, de que Deus governa o universo e intervém nos assuntos humanos, guiando os eventos para um fim preestabelecido. Santo Agostinho, por exemplo, defendia uma visão forte da predestinação e da graça divina.
- Livre-Arbítrio vs. Determinismo: Um debate filosófico central sobre se as ações humanas são escolhidas livremente pelo indivíduo (livre-arbítrio) ou se são o resultado inevitável de causas anteriores (determinismo). O mito de Édipo inclina-se fortemente para o determinismo/destino.
- Existencialismo (Sartre): Filosofia que enfatiza a liberdade individual, responsabilidade e subjetividade. Afirma que "a existência precede a essência", significando que os humanos não têm uma natureza predefinida e criam a si mesmos através de suas ações. Contrapõe-se diretamente ao determinismo.
