Provão de Bolsas Estratégia 2021

Plebiscito

A cena passa-se em 1890.

A família está toda reunida na sala de jantar. O senhor Rodrigues palita os dentes, repimpado numa cadeira de balanço. Acabou de comer como um abade.

Dona Bernardina, sua esposa, está muito entretida a limpar a gaiola de um canário belga.

Os pequenos são dois, um menino e uma menina. Ela distrai-se a olhar para o canário. Ele, encostado à mesa, os pés cruzados, lê com muita atenção uma das nossas folhas diárias.

Silêncio.

De repente, o menino levanta a cabeça e pergunta:

– Papai, o que é plebiscito?

O senhor Rodrigues fecha os olhos imediatamente para fingir que dorme. O pequeno insiste.

– Papai? Pausa.

– Papai?

Dona Bernardina intervém:

– Ó seu Rodrigues, Manduca está lhe chamando. Não durma depois do jantar que lhe faz mal. O senhor Rodrigues não tem outro remédio senão abrir os olhos.

– Que é? Que desejam vocês?

– Eu queria que papai me dissesse o que é plebiscito.

– Ora essa, rapaz! Então tu vais fazer doze anos e não sabes ainda o que é plebiscito?

– Se soubesse não perguntava.

O senhor Rodrigues volta-se para dona Bernardina, que continua muito ocupada com a gaiola:

– Ó senhora, o pequeno não sabe o que é plebiscito!

– Não admira que ele não saiba, porque eu também não sei.

– Que me diz?! Pois a senhora não sabe o que é plebiscito?

– Nem eu, nem você: aqui em casa ninguém sabe o que é plebiscito.

– Ninguém, alto lá! Creio que tenho dado provas de não ser nenhum ignorante!

– A sua cara não me engana. Você é muito prosa. Vamos: se sabe, diga o que é plebiscito! Então? A gente está esperando! Diga!…

– A senhora o que quer é enfezar-me!

– Mas, homem de Deus, para que você não há de confessar que não sabe? Não é nenhuma vergonha ignorar qualquer palavra. Já outro dia foi a mesma coisa quando Manduca lhe perguntou o que era proletário. Você falou, falou, e o menino ficou sem saber!

– Proletário, acudiu o senhor Rodrigues, é o cidadão pobre que vive do trabalho mal remunerado.

– Sim, agora sabe porque foi ao dicionário: mas dou-lhe um doce, se me disser o que é plebiscito sem se arredar dessa cadeira!

– Que gostinho tem a senhora em tornar-me ridículo na presença destas crianças!

– Oh! Ridículo é você mesmo quem se faz. Seria tão simples dizer: – Não sei, Manduca, não sei o que é plebiscito, vai buscar o dicionário, meu filho.

O senhor Rodrigues ergue-se de um ímpeto e brada:

– Mas se eu sei!

– Pois se sabe, diga!

– Não digo para não me humilhar diante de meus filhos! Não dou o braço a torcer! Quero conservar a força moral que devo ter nesta casa! Vá para o diabo!

E o senhor Rodrigues, exasperadíssimo, nervoso, deixa a sala de jantar e vai para o quarto, batendo violentamente a porta.

No quarto havia o que ele mais precisava naquela ocasião: algumas gotas de água de flor de laranja e um dicionário…

A menina toma a palavra:

– Coitado do papai! Zangou-se logo depois do jantar! Dizem que é perigoso!

– Não fosse tolo, observa dona Bernardina, e confessasse francamente que não sabia o que é plebiscito!

– Pois sim, acode o Manduca, muito pesaroso por ter sido o causador involuntário de toda aquela discussão: pois sim, mamãe, chame papai e façam as pazes.

– Sim! sim! façam as pazes! Diz a menina em tom meigo e suplicante. Que tolice! Duas pessoas que se estimam tanto zangarem-se por causa do plebiscito!

Dona Bernardina dá um beijo na filha e vai bater à porta do quarto:

– Seu Rodrigues, venha sentar-se; não vale a pena zangar-se por tão pouco.

O negociante esperava a deixa. A porta abre-se imediatamente. Ele entra, atravessa a casa e vai sentar-se na cadeira de balanço.

– É boa! brada o senhor Rodrigues depois de largo silêncio; é muito boa! Eu! Eu ignorar a significação da palavra PLEBISCITO! Eu!…

A mulher e os filhos aproximam-se dele.

O homem continua num tom profundamente dogmático.

– Plebiscito…

E olha para todos os lados a ver se há por ali mais alguém que possa aproveitar a lição.

– Plebiscito é uma lei decretada pelo povo romano, estabelecida em comícios.

– Ah! Suspiraram todos aliviados.

– Uma lei romana, percebem? E querem introduzir no Brasil! É mais um estrangeirismo!…

AZEVEDO, Artur. Contos de Artur Azevedo. São Paulo: DCL, 2005

“A menina toma a palavra:

– Coitado do papai! Zangou-se logo depois do jantar! Dizem que é perigoso!

– Não fosse tolo, observa dona Bernardina, e confessasse francamente que não sabia o que é plebiscito!”

Considerando o excerto retirado do texto Plebiscito, de Artur de Azevedo, e o trecho em destaque, identifique a alternativa que apresenta o termo com a mesma função sintática.
a
“Dona Bernardina, sua esposa, está muito entretida a limpar a gaiola de um canário belga.”
b
“Ele, encostado à mesa, os pés cruzados, lê com muita atenção uma das nossas folhas diárias.”
c
“Vamos: se sabe, diga o que é plebiscito! Então? A gente está esperando! Diga!…”
d
“– Não sei, Manduca, não sei o que é plebiscito, vai buscar o dicionário, meu filho.”
e
“O senhor Rodrigues fecha os olhos imediatamente para fingir que dorme.”
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