Para responder à questão, leia um trecho da “Lira II” da obra Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810).
Pintam, Marília, os Poetas
A um menino vendado,
Com uma aljava1 de setas,
Arco empunhado na mão;
Ligeiras asas nos ombros,
O tenro corpo despido,
E de Amor ou de Cupido
São os nomes, que lhe dão.
Porém eu, Marília, nego,
Que assim seja Amor, pois ele
Nem é moço nem é cego,
Nem setas nem asas tem.
Ora pois, eu vou formar-lhe
Um retrato mais perfeito,
Que ele já feriu meu peito;
Por isso o conheço bem.
Os seus compridos cabelos,
Que sobre as costas ondeiam,
São que os de Apolo mais belos;
Mas de loura cor não são.
Têm a cor da negra noite;
E com o branco do rosto
Fazem, Marília, um composto
Da mais formosa união.
[...]
Chamei-lhe um dia formoso;
Ele, ouvindo os seus louvores,
Com um modo desdenhoso
Se sorriu e não falou.
Pintei-lhe outra vez o estado,
Em que estava esta alma posta;
Não me deu também resposta,
Constrangeu-se e suspirou.
Conheço os sinais; e logo,
Animado da esperança,
Busco dar um desafogo
Ao cansado coração.
Pego em teus dedos nevados,
E querendo dar-lhe um beijo,
Cobriu-se todo de pejo,
E fugiu-me com a mão.
Tu, Marília, agora vendo
De Amor o lindo retrato,
Contigo estarás dizendo
Que é este o retrato teu.
Sim, Marília, a cópia é tua,
Que Cupido é Deus suposto:
Se há Cupido, é só teu rosto,
Que ele foi quem me venceu.
(Domício Proença Filho (org.). A poesia dos inconfidentes, 1996.)
1 aljava: estojo em que se guardavam setas (ou flechas).
É formada pelo processo de derivação sufixal a palavra:
“tenro” (1a estrofe)
“compridos” (3a estrofe)
“desdenhoso” (4a estrofe)
“retrato” (2a estrofe)
“desafogo” (5a estrofe)