Para responder à questão, leia a “Lira XVIII” da obra Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga.
Não vês aquele velho respeitável,
Que, à muleta encostado,
Apenas mal se move e mal se arrasta?
Oh! quanto estrago não lhe fez o tempo,
O tempo arrebatado,
Que o mesmo bronze gasta!
Enrugaram-se as faces e perderam
Seus olhos a viveza;
Voltou-se o seu cabelo em branca neve;
Já lhe treme a cabeça, a mão, o queixo,
Nem tem uma beleza
Das belezas que teve.
Assim também serei, minha Marília,
Daqui a poucos anos,
Que o ímpio tempo para todos corre.
Os dentes cairão, e os meus cabelos.
Ah! sentirei os danos,
Que evita só quem morre.
Mas sempre passarei uma velhice
Muito menos penosa.
Não trarei a muleta carregada:
Descansarei o já vergado corpo
Na tua mão piedosa,
Na tua mão nevada.
As frias tardes, em que negra nuvem
Os chuveiros não lance,
Irei contigo ao prado florescente:
Aqui me buscarás um sítio ameno,
Onde os membros descanse,
E ao branco Sol me aquente.
Apenas me sentar, então, movendo
Os olhos por aquela
Vistosa parte, que ficar fronteira,
Apontando direi: Ali falamos,
Ali, ó minha bela,
Te vi a vez primeira.
Verterão os meus olhos duas fontes,
Nascidas de alegria;
Farão teus olhos ternos outro tanto;
Então darei, Marília, frios beijos
Na mão formosa e pia,
Que me limpar o pranto.
Assim irá, Marília, docemente
Meu corpo suportando
Do tempo desumano a dura guerra.
Contente morrerei, por ser Marília
Quem, sentida, chorando,
Meus baços olhos cerra.
(Domício Proença Filho (org.). A poesia dos inconfidentes, 2002.)
O eu lírico recorre à figura de linguagem conhecida como hipérbole no seguinte verso:
“Descansarei o já vergado corpo” (4a estrofe)
“Já lhe treme a cabeça, a mão, o queixo,” (2a estrofe)
“Verterão os meus olhos duas fontes,” (7a estrofe)
“Irei contigo ao prado florescente:” (5a estrofe)
“Oh! quanto estrago não lhe fez o tempo,” (1a estrofe)