O texto a seguir é parte de um dos sermões do Padre Antônio Vieira pregado na Irmandade dos Pretos de um engenho da Bahia, em 1633. Esse discurso traça uma semelhança entre o Cristo crucificado e a condição de trabalho daqueles que lá se encontravam.
Escreve o Padre Antônio Vieira:
Em um engenho, sois imitadores de Cristo crucificado (...) porque padeceis em um modo muito semelhante o que o mesmo Senhor padeceu na sua cruz, e em toda sua Paixão. A sua cruz foi composta de dois madeireiros, e a vossa em um engenho é de três. Também ali não faltaram as canas, porque duas vezes entraram na Paixão: uma vez servindo para o escárnio e outra vez para a esponja em que lhe deram o fel. A Paixão de Cristo parte foi de noite, parte de dia, sem descansar, e tais são as vossas noites e os vossos dias. Cristo despido e vós despidos; Cristo sem comer, e vós famintos; Cristo em tudo maltratado, e vós maltratados em tudo. Os ferros, as prisões, os açoites, as chagas, os nomes afrontosos, de tudo isto se compõe a vossa imitação, que se for acompanhada de paciência, também terá merecimento de martírio (...) Em todas invenções e instrumentos de trabalho parece que não achou o Senhor outro mais que parecido fosse com o seu, que o vosso. A propriedade e energia desta comparação é porque no instrumento da Cruz e na oficina de toda a Paixão, assim, como nas outras em que se espreme o sumo dos frutos, assim foi espremido todo o sangue da humanidade sagrada.
CIDADE, Hermani (org.), Padre Vieira. Lisboa: Sá da Costa, 1940.
Além dos aspectos religiosos, o sermão de Padre Antônio Vieira evoca outro aspecto ideológico referente à ocultação de um discurso.
Numa leitura na perspectiva da atualidade, o leitor é levado a inferir que esse discurso seja o da
discussão sobre valores éticos.
busca do bem comum.
aceitação da escravidão.
integração de caráter social.
enaltecimento de virtudes humanas.