O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os
dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas
um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a
fazer compras na venda; ensarilhavam-se* discussões e
[5] rezingas**; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava,
gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sanguínea, naquela
gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés
vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de
existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra.
[10] Da porta da venda que dava para o cortiço iam e vinham
como formigas; fazendo compras.
Duas janelas do Miranda abriram-se. Apareceu numa a
Isaura, que se dispunha a começar a limpeza da casa.
Duas janelas do Miranda abriram-se. Apareceu numa a
Isaura, que se dispunha a começar a limpeza da casa.
-Nhá Dunga! gritou ela para baixo, a sacudir um pano
[15] de mesa; se você tem cuscuz de milho hoje, bata na porta,
ouviu?
Aluísio Azevedo, O cortiço.
* ensarilhar-se: emaranhar-se.
** rezinga: resmungo.
Uma característica do Naturalismo presente no texto é:
forte apelo aos sentidos.
idealização do espaço.
exaltação da natureza
realce de aspectos raciais.
ênfase nas individualidades.