O que é uma garota e para que serve (Adaptado)
Ana de Miguel Álvarez
Em nosso tempo de políticas ativas para a igualdade, há uma dupla verdade, porque a pornografia ensina que as mulheres estão aí para serem usadas e que o prazer deles é obtido mediante o sexo com humilhação, abuso e agressão
Parece que nossa sociedade convive hoje com duas verdades opostas em relação ao que é uma garota e o que se pode fazer com ela. Foi o que nos revelou a recente sentença do julgamento de La Manada, em que a Justiça determinou que não houve violência nem intimidação no abuso sexual de uma mulher por cinco homens em 2016. É como se no mundo oficial, que precisa passar publicamente nos exames, se mantivesse um discurso igualitário, mas em outros lugares se aprendesse outra verdade que perpassa tudo. Mas que ninguém quer tornar explícita. A nossa sociedade que enche a boca com a palavra igualdade.
Vamos brincar, que é muito educativo, e tome: uma caixa de maquiagem para a menina e a espada laser de Darth Vader para o garoto. E se você comenta alguma coisa, lá vem a resposta: "Ora, mulher, não seja antiquada". Como agora já há igualdade, e já a apoiamos, então podemos nos dedicar a cultivar o rosa e o azul. Ao grito de "hoje são educados igual", encontramos um mundo em que não há patinetes, nem estojos, nem bicicletas, nem carteiras. Há carteiras de meninas e carteiras de meninos. Até as réguas e as borrachas têm hoje princesas ou piratas. Nos tempos da igualdade formal e de políticas ativas de igualdade, a diferença vem marcada a ferro e fogo. E disso é preciso se encarregar o mundo da cultura, o mundo da criação, que não é nem mais nem menos aquele em que se forjam nossos sonhos e o sentido de nossa vida. E onde nada é igual para uma menina e para um menino.
É a partir daí que se mostra aos meninos que elas existem, no fundo, para "que suas vidas sejam fáceis e agradáveis". Neste mesmo jornal temos lido reportagens interessantes sobre o papel da pornografia na educação sexual dos adolescentes. Queremos propor aqui que ela também é fundamental no aprendizado da "dupla verdade" do que é uma garota e para que serve. Primeira verdade: uma garota é a que se senta ao meu lado, minha igual absoluta. Segunda verdade: é também o corpo, as partes do corpo, que me são oferecidas na infinita rede de portais de pornografia. Corpos aos quais eles têm direito a ter acesso para seu prazer. E é a própria sociedade quem as coloca aí, de bandeja, pelo teclado.
O que a pornografia ensina? Por exemplo, que as meninas estão aí para serem usadas. Coloquem no buscador "pornô/estupros". E encarem a realidade de como nossos meninos aprendem esta outra verdade sobre o que é uma menina e o que se pode fazer com ela. Nesta sociedade sexualizada, pacata e vergonhosa, quase ninguém se atreve a criticar uma prática se há sexo no meio.
E elas, o que elas aprendem? Em primeiro lugar, um modelo físico e a obrigação de depilar suas partes sexuais. A pornografia atual, com protagonistas infantilizadas, ensina que os pelos púbicos são sujos, pouco higiênicos, feios. E viva o empoderamento. O segundo, que servem para dar prazer, "para que as vidas de outros sejam fáceis e agradáveis". Estou dizendo algo desconhecido se falar que os vídeos com mais visitas são os que mostram as garotas sofrendo ou não gostando na "relação sexual"? E para eles, tudo bem
Se queremos erradicar a desigualdade teremos de lutar contra suas causas. E o que se denomina pornografia é uma delas. Porque o que isso representa em sua maior parte não é o "ato sexual", mas a humilhação, o abuso e a agressão de mulheres jovens como fonte de prazer. E tudo bem acessível para meninas e meninos na idade do primeiro celular. Atualmente, quando já há igualdade.
(https://brasil.elpais.com/brasil/2018/05/10/opinion/1525956123_5 79679.html. Acesso em 18/5/2018)
Assinale a alternativa em que a substituição do elemento destacado no enunciado poder-se-ia dar, sem prejuízo sintático e semântico, pelo que se propõe dentro dos colchetes.
“...a recente sentença do julgamento de La Manada, em que [na qual] a Justiça determinou que não houve violência...”
“...então podemos nos dedicar a [à] cultivar o rosa e o azul...”
“Atualmente, quando [no qual] já há igualdade...”
“Por exemplo, que [quem] as meninas estão aí para serem usadas.”
Estou dizendo algo desconhecido se falar que [cujos] os vídeos com mais visitas...'