O Cortiço
( . . . )
Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas. De alguns quartos saiam mulheres que vinham pendurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se à luz nova do dia.
Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas. Uns, após outros, lavavam a cara, incomodamente, debaixo do fio de água que escorria da altura de uns cinco palmos. O chão inundava-se. As mulheres precisavam já prender as saias entre as coxas para não as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos braços e do pescoço, que elas despiam, suspendendo o cabelo todo para o alto do casco; os homens, esses não se preocupavam em não molhar o pelo, ao contrário metiam a cabeça bem debaixo da água e esfregavam com força as ventas e as barbas, fossando e fungando contra as palmas da mão. As portas das latrinas não descansavam, era um abrir e fechar de cada instante, um entrar e sair sem tréguas. Não se demoravam lá dentro e vinham ainda amarrando as calças ou as saias; as crianças não se davam ao trabalho de lá ir, despachavam-se ali mesmo, no capinzal dos fundos, por detrás da estalagem ou no recanto das hortas.
( . . . )
(AZEVEDO, Aluísio. Coleção a obra prima de cada autor. O Cortiço - fragmento. 3ª ed. São Paulo. Martin Claret, 2010. P.36-37)
Considerando que, de acordo com a periodização da literatura brasileira, Realismo e Naturalismo ocorreram simultaneamente, após a leitura do fragmento, analise as afirmativas abaixo e, a seguir, assinale a resposta correta
I. Texto naturalista de desdobramento realista, pois retrata pessoas marginalizadas pela sociedade. É fruto da experiência e, por isso, as personagens são tidas como parte da natureza.
II. O texto é parnasiano, pois retrata uma literatura de combate social, crítica à burguesia, ao adultério e ao clero. Analisa psicologicamente as ações das personagens.
III. Texto essencialmente realista. A maior preocupação dos escritores realistas é com o fazer poético. Arte pela arte com vocabulário nobre; objetividade.
A alternativa que responde à questão é:
I e II estão corretas;
I, II e III estão corretas;
Apenas a I está correta;
Apenas a III está correta.