No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá onde a
criança diz: Eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não funciona
para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um verbo, ele delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta, que é a voz de fazer nascimentos —
O verbo tem que pegar delírio.
Manoel de Barros. O livro das ignorãças – poesia completa. São Paulo: Leya, 2010, p. 301.
Com referência ao poema acima, de Manoel de Barros, julgue o item a seguir.
No poema apresentado, Manoel de Barros usa de forma ambígua o vocábulo “verbo”, que tanto pode significar palavra quanto designar uma das categorias gramaticais.
CERTO
ERRADO
O poema de Manoel de Barros brinca com a ambiguidade de “verbo”, que tanto pode representar uma categoria gramatical quanto, mais amplamente, a palavra ou a linguagem. A criança no texto “escuta” cores, deslocando o sentido comum de “escutar” – que se refere a sons – e permitindo ao verbo assumir sentidos diferentes e criativos. Nesse contexto, dizer que Manoel de Barros usa o termo “verbo” de forma ambígua faz todo sentido: ele explora o verbo tanto no sentido linguístico e gramatical, quanto no domínio poético, em que a palavra pode transcender usos convencionais. Por isso, a afirmação é correta.
Ambiguidade: emprego de um termo que pode assumir mais de um sentido.
Função poética da linguagem: a poesia muitas vezes subverte usos convencionais dos termos para criar novas possibilidades de sentido, explorando as potencialidades artísticas e subjetivas da palavra.
Categoria gramatical: na língua portuguesa, “verbo” é a classe de palavra que indica ação, estado ou fenômeno.