Leia os trechos do conto popular apresentado a seguir.
Então, o lobo chegou primeiro à casa. [...] vestiu a roupa
da avó e deitou na cama à espera da menina. [...]
O lobo disse:
- Tire a roupa e deite-se na cama comigo.
A menina perguntou:
- Onde ponho o meu avental?
O lobo respondeu:
- Jogue no fogo. Você não vai mais precisar dele.
Para cada peça de roupa – corpete, saia, anágua e meias
– a menina fazia a mesma pergunta. E, a cada vez, o lobo
respondia:
- Jogue no fogo. Você não vai precisar mais dela. […]
- Ah, vovó! Que dentes grandes você tem!
- É para comer melhor você, querida.
E ele a devorou.
DARNTON, Robert. O grande massacre de gatos e outros episódios da história cultural francesa. Rio de Janeiro: Graal, 1986. p. 22.
Esses trechos integram uma versão do conto popular “Chapeuzinho Vermelho”. Com pequenas alterações, assim os camponeses narravam o final desse conto na França no século XVIII. Distinto da versão que se conhece, ele expressa o universo simbólico camponês na medida em que
o erotismo implícito na narrativa manifesta que a infância era ignorada como uma fase distinta da vida.
a referência constante à comida remonta a um universo de abundância entre os camponeses.
a ausência da “moral da história” expõe uma sociedade marcada pela descrença religiosa.
as ações violentas descritas constroem uma imagem negativa da floresta em oposição à da aldeia.
as trajetórias das personagens aludem à dissolução dos laços familiares no mundo rural.