Leia os textos abaixo para responder à questão
TEXTO
“Guimarães Rosa escreveu sua obra no português do Brasil, uma língua muito mais rica do que o português europeu, na medida em que assimilou um sem-número de elementos provenientes dos idiomas dos índios e negros que desempenharam papel de relevo na formação étnica e cultural do país. Entretanto, o autor não se limitou apenas a reproduzir a linguagem falada no Brasil. E à síntese já existente, acrescentou sua própria síntese: uma estrutura sintática bastante peculiar e um léxico que inclui grande número de neologismos; vocábulos extraídos de idiomas estrangeiros ou revitalizados do antigo português; e uma série de termos indígenas ou dialetais que ainda não tinham sido incorporados à sua língua de origem [...]”.
(COUTINHO, Afrânio. Guimarães Rosa e o processo de revitalização da linguagem. In: COUTINHO, Eduardo F. (Org.). Guimarães Rosa: fortuna crítica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.)
TEXTO
“Estou contando ao senhor, que carece de um explicado. Pensar mal é fácil, porque esta vida é embrejada. A gente vive, eu acho, é mesmo para se desiludir e desmisturar. A senvergonhice reina, tão leve e leve pertencidamente, que por primeiro não se crê no sincero sem maldade. Está certo, sei. Mas ponho minha fiança: homem muito homem que fui, e homem por mulheres! – nunca tive inclinação para os vícios desencontrados. Repito o que, o sem preceito. Então – o senhor me perguntará – o que era aquilo? Ah, lei ladra, o poder da vida. Direitinho declaro o que, durando todo o tempo, sempre mais, às vezes menos, comigo se passou. Aquela mandante amizade. Eu não pensava em adiação nenhuma, de pior propósito. Mas eu gostava dele, dia mais dia, mais gostava. Diga o senhor: como um feitiço? Isso. Feito coisa-feita. Era ele fechar a cara e estar tristonho, e eu perdia meu sossego. Era ele estar por longe, eu só nele pensava. E eu mesmo não entendia então o que aquilo era? Sei que sim. Mas não. E eu mesmo entender não queria [...]”.
(ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.)
TEXTO
“A experiência que passa de pessoa a pessoa é a fonte a que recorrem todos os narradores. E, entre as narrativas escritas, as melhores são as que menos se distinguem das histórias orais contadas pelos inúmeros narradores anônimos. Entre estes, existem dois grupos, que se interpenetram de múltiplas maneiras. A figura do narrador só se torna plenamente tangível se temos presentes esses dois grupos. ‘Quem viaja tem muito que contar’, diz o povo, e com isso imagina o narrador como alguém que vem de longe. Mas também escutamos com prazer o homem que ganhou honestamente sua vida sem sair do seu país e que conhece suas histórias e tradições. Se quisermos concretizar esses dois grupos através dos seus representantes arcaicos, podemos dizer que um é exemplificado pelo camponês sedentário, e outro, pelo marinheiro comerciante [...]”.
(BENJAMIN, Walter. O narrador – Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In:_________ Magia e técnica, arte e política. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1994.)
Ainda em relação aos três textos apresentados, marque a opção correta:
O narrador do Grande sertão: veredas se situa no tempo presente e faz um exercício de rememoração, de volta ao passado, para tentar compreender o que se sucedeu com ele.
O narrador do Grande sertão: veredas desenvolve um monólogo cheio de certezas indiscutíveis e ignora o seu interlocutor, como se o seu fluxo verbal fosse capaz, por si mesmo, de fornecer todas as respostas para suas indagações acerca dos caminhos que sua vida trilhou até ali.
Afrânio Coutinho afirma que a linguagem na prosa de ficção de Guimarães Rosa faz com que ele se posicione entre os autores que menos relevância tiveram para a renovação dos meios expressivos da literatura brasileira.Para Walter Benjamin, os procedimentos narrativos das duas grandes famílias de narradores não se aproximam em momento algum, fazendo com que seja simples identificá-los em suas particularidades e em seus universos restritos.
Para Walter Benjamin, os procedimentos narrativos das duas grandes famílias de narradores não se aproximam em momento algum, fazendo com que seja simples identificá-los em suas particularidades e em seus universos restritos.
O texto de Afrânio Coutinho é literário. O texto de João Guimarães Rosa é literário. E o texto de Walter Benjamin é não-literário.