UEA SIS 2ª Etapa 2018

Leia o trecho do romance Iracema, de José de Alencar, para responder à questão.

 

    Iracema cantava docemente, embalando a rede para acalentar o filho [Moacir].
    A areia da praia crepitou1 sob o pé forte e rijo do guerreiro tabajara, que vinha das bordas do mar depois da abundante pesca.
    A jovem mãe cruzou as franjas da rede, para que as moscas não inquietassem o filho acalentado, e foi ao encontro do irmão:
    – Caubi vai tornar às montanhas dos tabajaras! disse ela com brandura.
    O guerreiro anuviou-se:
    – Tu despedes teu irmão da cabana para que ele não veja a tristeza que a enche.
    – Araquém teve muitos filhos em sua mocidade; uns a guerra levou e morreram como valentes; outros escolheram uma esposa e geraram por sua vez numerosa prole; filhos de sua velhice, Araquém só teve dois. Iracema é a rola que o caçador tirou do ninho. Só resta o guerreiro Caubiao velho Pajé, para suster seu corpo vergado e guiar seu passo trêmulo.
    – Caubi partirá quando a sombra deixar o rosto de Iracema.
    – Como a estrela que só brilha de noite, vive Iracema em sua tristeza. Só os olhos do esposo podem apagar a sombra em seu rosto. Parte, para que eles não se turvem com tua vista.
    – Teu irmão parte para te fazer a vontade; mas ele voltará todas as vezes que o cajueiro florescer, para sentir em seu coração o filho de teu ventre.
    Entrou na cabana. Iracema tirou da rede a criança, e ambos, mãe e filho, palpitaram sobre o peito do guerreiro tabajara. Depois, Caubi passou a porta e sumiu-se entre as árvores.
    Iracema, arrastando o passo trêmulo, o acompanhou de longe até que o perdeu de vista na orla da mata. Aí parou; quando o grito da jandaia2 de envolta com o choro infantil a chamou à cabana, a areia fria onde esteve sentada guardou o segredo do pranto que embebera.
    A jovem mãe suspendeu o filho à teta; mas a boca infantil não emudeceu. O leite escasso não apojava3 o peito.
    O sangue da infeliz diluía-se todo nas lágrimas incessantes que não lhe estancavam nos olhos; pouco chegava aos seios, onde se forma o primeiro licor da vida.
    Ela dissolveu a alva carimã4 e preparou ao fogo o mingau para nutrir o filho. Quando o sol dourou a crista dos montes, partiu para a mata, levando ao colo a criança adormecida.
    Na espessura do bosque estava o leito da irara5 ausente; os tenros cachorrinhos6 grunhem enrolando-se uns sobre os outros. A formosa tabajara aproxima-se de manso. Prepara para o filho um berço da macia rama do maracujá e senta-se perto.
    Põe no regaço um por um os filhos da irara e Ihes abandona os seios mimosos, cuja teta rubra como a pitanga ungiu do mel da abelha. Os cachorrinhos famintos sugam os peitos avaros de leite.
    Iracema curte dor como nunca sentiu; parece que lhe exaurem a vida, mas os seios vão-se intumescendo; apojaram afinal, e o leite, ainda rubro do sangue de que se formou, esguicha.
    A feliz mãe arroja de si os cachorrinhos, e cheia de júbilo mata a fome ao filho. Ele é agora duas vezes filho de sua dor, nascido dela e também nutrido.

    A filha de Araquém sentiu afinal que suas veias se estancavam; e contudo o lábio amargo de tristeza recusava o alimento que devia restaurar-lhe as forças. O gemido e o suspiro tinham crestado com o sorriso e o sabor em sua boca formosa.
(Iracema, 2006.)
 

1 crepitar: estalar, produzir estalos ou estalidos por ação do fogo ou da brasa.
2 jandaia: ave florestal de plumagem verde-escura e fronte e abdome vermelhos.
3 apojar: fazer encher ou encher-se de leite.
4 carimã: uma preparação de mandioca.
5 irara: mamífero carnívoro, florestal, de corpo esguio, com pelagem curta e áspera.
6 cachorro: filhote.

   Personificação é a figura de linguagem que consiste em pensar seres inanimados ou irracionais como se eles fossem humanos, atribuindo-lhes linguagem, sentimentos e ações típicos dos seres humanos.
(Hélio de Seixas Guimarães. Figuras de linguagem, 1988. Adaptado.)

 

Verifica-se o recurso à personificação no trecho:

a

“A areia da praia crepitou sob o pé forte e rijo do guerreiro tabajara” (2o parágrafo).

b

“Como a estrela que só brilha de noite, vive Iracema em sua tristeza” (9o parágrafo).

c

“mas ele voltará todas as vezes que o cajueiro florescer” (10o parágrafo).

d

“a areia fria onde esteve sentada guardou o segredo do pranto que embebera” (12o parágrafo).

e

“O sangue da infeliz diluía-se todo nas lágrimas incessantes que não lhe estancavam nos olhos” (14o parágrafo).

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Resposta
D

Resolução

Neste excerto de Iracema, de José de Alencar, estamos analisando onde ocorre o recurso linguístico conhecido como personificação. A personificação (também chamada prosopopeia) consiste em atribuir características e ações tipicamente humanas a entidades que não são humanas, como seres inanimados ou irracionais.

O trecho que melhor exemplifica a personificação é aquele em que A AREIA “guardou o segredo do pranto”, conferindo a ela a capacidade de guardar algo em confidência, como se tivesse sentimentos ou intenções humanas. Por isso, a resposta correta é a alternativa D.

Dicas

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Observe se algo inanimado está agindo como se fosse humano.
Personificação vai além de uma comparação simples; envolve atribuir, de fato, ações ou sentimentos do ser humano.

Erros Comuns

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Confundir verbos descritivos (como “crepitar”) com efeitos de personificação.
Interpretar metáforas ou comparações como personificações.
Considerar um simples evento natural (florescer) como se fosse ação humana.
Revisão

Personificação (ou prosopopeia) é uma figura de linguagem que consiste em atribuir características, sentimentos ou ações humanas a seres inanimados (objetos, lugares) ou irracionais (animais, plantas). Ela é empregada para tornar a linguagem mais expressiva e poética, aproximando o leitor do universo narrado.

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