UFRGS FIS LIT ING ESP 2018

Leia o trecho da crônica O vestuário feminino, de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934).

 

  É uma esquisitice muito comum entre senhoras intelectuais, envergarem paletó, colete e colarinho de homem, ao apresentarem-se em público, procurando confundir-se, no aspecto físico, com os homens, como se lhes não bastassem as aproximações igualitárias do espírito.

  Esse desdém da mulher pela mulher faz pensar que: ou as doutoras julgam, como os homens, que a mentalidade da mulher é inferior, e que, sendo elas exceção da grande regra, pertencem mais ao sexo forte, do que do nosso, fragílimo; ou que isso revela apenas pretensão de despretensão

  Seja o que for, nem a moral nem a estética ganham nada com isso. Ao contrário; se uma mulher triunfa da má vontade dos homens e das leis, dos preconceitos do meio e da raça, todas as vezes que for chamada ao seu posto de trabalho, com tanta dor, tanta esperança, e tanto susto adquirido, deve ufanar-se em apresentar-se como mulher. Seria isso um desafio?

  Não; naturalíssimo pareceria a toda a gente que uma mulher se apresentasse em público como todas as outras. [...]

  Os colarinhos engomados, as camisas de peito chato, dão às mulheres uma linha pouco sinuosa, e contrafeita, porque é disfarçada. [...] 

  Nas cidades, sobre o asfalto das ruas ou o saibro das alamedas, não sabe a gente verdadeiramente para que razão apelar, quando vê, cingidas a corpos femininos, essas toilettes híbridas, compostas de saias de mulher, coletes e paletós de homem... Nem tampouco é fácil de perceber o motivo por que, em vez da fita macia, preferem essas senhoras especar o pescoço num colarinho lustrado a ferro, e duro como um papelão

 

Considere as seguintes afirmações sobre o trecho. 

 

I - A crônica, publicada em 1906, registra as exigências que uma sociedade patriarcal impõe a mulheres que circulam no âmbito público.

II - A crônica apresenta um chamado para que mulheres de atuação pública – espaço majoritariamente masculino – mantenham características convencionadas como femininas, em especial no vestuário.

III- A autora, ao falar do vestuário feminino, está tratando também de meio, raça e gênero, temas estruturantes do debate literário no final do século XIX, início do XX.

 

Quais estão corretas?

a

Apenas II. 

b

Apenas III.

c

Apenas I e II. 

d

Apenas I e III. 

e

I, II e III.

Ver resposta
Ver resposta
Resposta
E

Resolução

A crônica de Júlia Lopes de Almeida sugere que a autora percebe uma sociedade patriarcal que restringe a expressão das mulheres em espaços públicos e, ao mesmo tempo, discute a imposição de códigos de vestimenta femininos. As três afirmações abordam aspectos diferentes, porém complementares, dessa crítica. Portanto, as três estão corretas. A resposta certa é a letra E.

Dicas

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Atente ao modo como a autora descreve o espaço predominantemente masculino da vida pública.
Observe as críticas repetidas às peças de roupa consideradas "de homem" e as razões que a autora apresenta.
Identifique em quais trechos se fala dos desafios enfrentados pelas mulheres em relação ao meio, às leis e aos preconceitos.

Erros Comuns

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Não perceber que a autora critica a postura social patriarcal e como a vestimenta reflete essa imposição.
Interpretar erroneamente o texto como mera crítica ao vestuário masculino, sem compreender a questão maior sobre padrões sociais e preconceitos.
Desconsiderar o contexto histórico e literário do fim do século XIX e início do XX para entender a alusão a meio, raça e gênero.
Revisão
A crônica é um gênero textual que, de modo leve e reflexivo, aborda temas do cotidiano e muitas vezes propõe reflexões sobre costumes e valores sociais. Neste texto, Júlia Lopes de Almeida discute as normas sociais que estabelecem como a mulher deve se portar em espaços públicos. O trecho evidencia a dimensão patriarcal da sociedade do início do século XX no Brasil, ao mesmo tempo em que questiona a rigidez dos papéis de gênero e do vestuário feminino e masculino.
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