UNIMES 2019

Leia o poema em prosa “O operário no mar”, de Carlos Drummond de Andrade, para responder à questão.

 

   Na rua passa um operário. Como vai firme! Não tem blusa. No conto, no drama, no discurso político, a dor do operário está na sua blusa azul, de pano grosso, nas mãos grossas, nos pés enormes, nos desconfortos enormes. Esse é um homem comum, apenas mais escuro que os outros, e com uma significação estranha no corpo, que carrega desígnios e segredos. Para onde vai ele, pisando assim tão firme? Não sei. A fábrica ficou lá atrás. Adiante é só o campo, com algumas árvores, o grande anúncio de gasolina americana e os fios, os fios, os fios. O operário não lhe sobra tempo de perceber que eles levam e trazem mensagens, que contam da Rússia, do Araguaia, dos Estados Unidos. Não ouve, na Câmara dos Deputados, o líder oposicionista vociferando. Caminha no campo e apenas repara que ali corre água, que mais adiante faz calor. Para onde vai o operário? Teria vergonha de chamá-lo meu irmão. Ele sabe que não é, nunca foi meu irmão, que não nos entenderemos nunca. E me despreza... Ou talvez seja eu próprio que me despreze a seus olhos. Tenho vergonha e vontade de encará-lo: uma fascinação quase me obriga a pular a janela, a cair em frente dele, sustar-lhe a marcha, pelo menos implorar-lhe que suste a marcha. Agora está caminhando no mar. Eu pensava que isso fosse privilégio de alguns santos e de navios. Mas não há nenhuma santidade no operário, e não vejo rodas nem hélices no seu corpo, aparentemente banal. Sinto que o mar se acovardou e deixou-o passar. Onde estão nossos exércitos que não impediram o milagre? Mas agora vejo que o operário está cansado e que se molhou, não muito, mas se molhou, e peixes escorrem de suas mãos. Vejo-o que se volta e me dirige um sorriso úmido. A palidez e confusão do seu rosto são a própria tarde que se decompõe. Daqui a um minuto será noite e estaremos irremediavelmente separados pelas circunstâncias atmosféricas, eu em terra firme, ele no meio do mar. Único e precário agente de ligação entre nós, seu sorriso cada vez mais frio atravessa as grandes massas líquidas, choca-se contra as formações salinas, as fortalezas da costa, as medusas, atravessa tudo e vem beijar-me o rosto, trazer-me uma esperança de compreensão. Sim, quem sabe se um dia o compreenderei?

(Sentimento do mundo, 1999.)

De acordo com seu eixo temático, o poema de Drummond pode ser enquadrado no contexto histórico-literário brasileiro

a

da 2ª geração modernista, visto que aborda a problemática de uma região específica por meio de recursos que a universalizam.

b

da 1ª geração modernista, visto que aborda a problemática do nacionalismo por meio da idealização da natureza e do homem.

c

da 1ª geração modernista, visto que aborda a problemática do nacionalismo por meio da investigação da vida popular.

d

da 2ª geração modernista, visto que aborda a problemática social por meio da constatação dos antagonismos de classe.

e

da 2ª geração modernista, visto que aborda a problemática da exclusão social por meio de uma aversão à classe trabalhadora.

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Resposta
D

Resolução

Neste poema em prosa de Carlos Drummond de Andrade, observamos a tensão entre o eu poético e o operário, que representa a classe trabalhadora, destacando as relações de desigualdade e o isolamento entre as classes. Através de figuras metafóricas, como o caminhar sobre o mar, o texto revela posições sociais diversas e a dificuldade de aproximação entre elas. Essa abordagem demonstra o caráter social da chamada "Geração de 30" do Modernismo brasileiro, em que temas como desigualdades, injustiças e conflitos de classe ocupam o centro da reflexão literária. A resposta correta é a alternativa D, uma vez que o poema retrata a problemática social por meio dos evidentes antagonismos de classe.

Dicas

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Observe como o eu poético se sente em relação ao operário.
Identifique o elemento de afastamento ou obstáculo que separa os dois personagens.

Erros Comuns

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Confundir o caráter social do texto com idealizações românticas do trabalhador.
Relacionar o poema a questões regionais em vez de perceber o antagonismo de classe em âmbito universal.
Pensar que a 1ª geração modernista prioriza a mesma abordagem social, quando de fato faz uso de nacionalismo crítico e renovação estética, mas não com essa ênfase.
Revisão

Modernismo brasileiro: O Modernismo no Brasil é dividido em fases, sendo a "Geração de 30" (2ª fase) marcada por uma intensa preocupação social, a busca por temas do cotidiano e reflexões sobre a condição humana. Carlos Drummond de Andrade é um dos autores representativos dessa geração.

Geração de 30: Também chamada de "fase de consolidação", caracteriza-se pela crítica social e pela abordagem de temas relativos à injustiça e à desigualdade, mantendo ainda a subjetividade, mas voltada para questões de classe e condição humana.

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