INSPER 2017/1

Leia o poema de Manuel Bandeira para responder à questão.

 

Evocação do Recife

 

Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois
– Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
A rua da União onde eu brincava de chicote-queimado
e partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê
na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras
mexericos namoros risadas
A gente brincava no meio da rua
(...)
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada

(Manuel Bandeira. Poesia completa e prosa, 1993. Adaptado)

O eu lírico afirma que “A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros / Vinha da boca do povo na língua errada do povo / Língua certa do povo / Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil”.

 

Nessa perspectiva do eu lírico, um exemplo dessa fala gostosa do português é:

a

Vós bem sabeis que o não dissemos por temer que vossa ira recaísse sobre nós. 

b

Atônita, correu pelo saguão à procura de um eventual cavalheiro que ali não havia. 

c

Encontrá-la-íamos com certeza nas areias da praia de Ipanema naquela manhã de sol. 

d

Nas ocasiões de aparato é que se podia tomar o pulso ao homem.

e

Me divirto vendo as crianças em dia de chuva, a chuva molha elas e está tudo bem.

Ver resposta
Ver resposta
Resposta
E

Resolução

A questão pede para identificar, entre as alternativas, um exemplo da "fala gostosa do português do Brasil" mencionada pelo eu lírico no poema "Evocação do Recife" de Manuel Bandeira.

1. Interpretação do Poema: O eu lírico expressa nostalgia por sua infância no Recife, valorizando as experiências vividas e a linguagem popular. Ele contrapõe essa vivência e linguagem autêntica ("Recife sem história nem literatura", "Recife da minha infância") a outras visões mais formais ou históricas da cidade ("Veneza americana", "Mauritsstad", "Recife dos Mascates", "Recife das revoluções libertárias").

2. A Visão sobre a Linguagem: Nos versos destacados ("A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros / Vinha da boca do povo na língua errada do povo / Língua certa do povo / Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil / Ao passo que nós / O que fazemos / É macaquear / A sintaxe lusíada"), o eu lírico critica a norma culta, formal, associada à escrita e à tradição lusitana ("sintaxe lusíada"), considerando-a artificial ("macaquear"). Em contraste, ele exalta a fala popular, mesmo que considerada "errada" pela gramática normativa, como a forma "certa" e "gostosa" de falar o português do Brasil. Essa fala "gostosa" refere-se, portanto, ao português coloquial, espontâneo, com suas características próprias, que muitas vezes se afastam da norma padrão.

3. Análise das Alternativas:

  • A: "Vós bem sabeis que o não dissemos por temer que vossa ira recaísse sobre nós." - Apresenta linguagem extremamente formal e arcaica (uso de "vós", "sabeis", "vossa", colocação pronominal "o não dissemos"). É o oposto da fala popular e espontânea.
  • B: "Atônita, correu pelo saguão à procura de um eventual cavalheiro que ali não havia." - Utiliza vocabulário formal ("atônita", "saguão", "eventual", "cavalheiro") e segue a norma culta. Não representa a fala coloquial.
  • C: "Encontrá-la-íamos com certeza nas areias da praia de Ipanema naquela manhã de sol." - Apresenta a mesóclise ("Encontrá-la-íamos"), uma construção verbal típica da norma culta escrita e extremamente rara na fala cotidiana brasileira.
  • D: "Nas ocasiões de aparato é que se podia tomar o pulso ao homem." - Usa linguagem formal ("aparato", "tomar o pulso a") e segue a norma padrão.
  • E: "Me divirto vendo as crianças em dia de chuva, a chuva molha elas e está tudo bem." - Esta alternativa contém marcas típicas da oralidade e do português coloquial brasileiro:
    • Início de frase com pronome oblíquo átono ("Me divirto"), comum na fala, mas evitado pela norma culta escrita (que preferiria "Divirto-me").
    • Uso do pronome pessoal do caso reto ("elas") como objeto direto ("molha elas"), outra característica marcante da fala popular brasileira (a norma culta exigiria "molha-as").
    Essa construção reflete a espontaneidade e as características gramaticais da "língua errada do povo" que o eu lírico considera a "língua certa" e "gostosa".

Conclusão: A alternativa E é a única que apresenta traços gramaticais e lexicais característicos da fala coloquial brasileira, alinhando-se à valorização da linguagem popular expressa pelo eu lírico no poema de Manuel Bandeira.

Dicas

expand_more
Releia os versos que definem a "fala gostosa": "língua errada do povo / Língua certa do povo". O que isso sugere sobre a relação dessa fala com a gramática normativa?
Pense em como as pessoas falam no dia a dia no Brasil. Quais das opções se assemelham mais a essa fala espontânea?
Procure por características gramaticais nas opções que são comuns na fala, mas que a gramática tradicional escrita costuma evitar (ex: colocação de pronomes, uso de pronomes retos como objeto).

Erros Comuns

expand_more
Interpretar a "fala gostosa" como sinônimo de linguagem correta segundo a norma culta ou de linguagem rebuscada.
Não reconhecer as marcas de coloquialidade presentes na alternativa E (próclise inicial, pronome reto como objeto direto).
Confundir a valorização da linguagem popular feita pelo eu lírico com a defesa de qualquer forma de erro ou desleixo linguístico (o poema valoriza a autenticidade da fala popular, não a incorreção por si só).
Achar que as alternativas com linguagem mais formal (A, B, C, D) seriam as corretas por serem mais "bonitas" ou "elaboradas", ignorando o contexto do poema.
Não compreender a crítica do eu lírico à artificialidade da "sintaxe lusíada" macaqueada.
Revisão

Revisão de Conceitos

1. Variação Linguística: A língua não é homogênea. Ela varia de acordo com fatores geográficos, sociais, históricos e situacionais. Distinguimos principalmente a norma culta (ou padrão), associada à escrita formal, à gramática normativa e aos grupos de maior prestígio social, e as variedades não padrão (ou coloquiais/populares), características da fala cotidiana e de diferentes grupos sociais. O poema aborda essa tensão entre a norma culta ("sintaxe lusíada") e a variedade popular ("língua errada do povo", "língua certa do povo").

2. Modernismo Brasileiro (1ª Fase): Manuel Bandeira é um dos grandes nomes do Modernismo brasileiro. Uma das características marcantes da primeira fase modernista (1922-1930) foi a busca por uma identidade nacional e a valorização da cultura brasileira, incluindo a linguagem coloquial e as "falas" regionais, em oposição ao academicismo e ao formalismo herdados do Parnasianismo e da tradição portuguesa.

3. Marcas da Oralidade/Coloquialismo no Português Brasileiro: Algumas características comuns na fala que diferem da norma culta escrita incluem: colocação pronominal (próclise mais frequente, inclusive no início de frases), uso de pronomes retos como objetos, simplificação de concordâncias, léxico informal, entre outras.

Transforme seus estudos com a AIO!
Estudantes como você estão acelerando suas aprovações usando nossa plataforma de IA + aprendizado ativo.
+25 pts
Aumento médio TRI
4x
Simulados mais rápidos
+50 mil
Estudantes
Jonas de Souza
As correções de redações e as aulas são bem organizadas e é claro os professores são os melhores com a melhor metodologia de ensino, sem dúvidas contribuiu muito para o aumento de 120 pontos na minha média final!
Débora Adelina
O que mais gostei foi a forma como a plataforma seleciona matérias em que tenho mais dificuldade, ajudando a focar no que realmente preciso de atenção. Ainda não consegui minha aprovação, mas contarei com a AIO por mais um ano pois a plataforma me aproximou desse objetivo tornando meus estudos mais direcionados!
Joice Neves
Faltavam 3 meses para o ENEM, eu estava desesperada e mentalmente fragilizada por não ver os resultados do meu esforço. Então, eu encontrei a AIO e, em 3 meses, eu consegui aumentar a minha nota média em 50 pontos. Meses depois, fui aprovada no curso que eu tanto desejei. Esse sonho se tornou real graças à AIO.
A AIO utiliza cookies para garantir uma melhor experiência. Ver política de privacidade
Aceitar