Infância – Carlos Drummond de Andrade
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.
No meio dia branco de luz uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala – nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.
Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
– Psiu… Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro… que fundo!
Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.
Disponível em: https://institutopoimenica.com/2012/07/22/ infancia-carlos-drummond-de-andrade/. Acesso em 12 set. 2016.
Ao citar um texto reconhecido da literatura mundial, “As aventuras de Robinson Crusoé”, de Daniel Defoe, Drummond pretendia
prestar uma homenagem ao autor inglês, citando-o como sua leitura primordial.
demonstrar que mesmo meninos nascidos no interior do Brasil tinham acesso aos grandes clássicos da literatura ocidental.
estabelecer uma relação de autoridade, visto que o romancista inglês é um autor significativo do repertório literário mundial.
fazer com que os leitores de seu poema viessem a conhecer o romance de Defoe, que, devido à distância de sua publicação, já havia se tornado esquecido.
apresentar, por meio de uma intertextualidade, as variadas possibilidades que temos de estabelecer relações com os textos da literatura universal.