Fragmento 1:
Fabiano atentou na farda com respeito e gaguejou, procurando as palavras de seu Tomás da Bolandeira:
− Isto é. Vamos e não vamos. Quer dizer. Enfim, contanto, etc. É conforme.
...
(...) Era bruto, sim senhor, nunca havia aprendido, não sabia explicar-se. Estava preso por isso? Como era? Então mete-se um homem na cadeia porque ele não sabe falar direito?
Fragmento 2:
(...) Ele nunca tinha ouvido falar em inferno. Estranhando a linguagem de Sinha Terta, pediu informações. Sinha Vitória, distraída, aludiu vagamente a certo lugar ruim demais, e como o filho exigisse uma descrição, encolheu os ombros.
...
(...) Não obteve resposta, voltou à cozinha, foi pendurar-se a saia da mãe: − Como é?
Sinha Vitória falou em espetos quentes e fogueiras.
− A senhora viu?
Aí Sinha Vitória se zangou, achou-o insolente e aplicou-lhe um cocorote.
O menino saiu indignado com a injustiça (...).
Os fragmentos são de Vidas Secas, de Graciliano Ramos. No fragmento 1, Fabiano foi preso pelo soldado amarelo e, no 2, o menino mais velho é castigado por querer satisfazer uma curiosidade. A partir dos excertos, pode-se dizer que a obra aborda a questão da linguagem como:
privilégio de uma elite social que a usa como forma de manter um status dentro da comunidade na qual está inserida.
representação da cultura oficial e um anseio da população mais carente, ávida de um instrumento de defesa.
instrumento de poder e repressão, uma vez que quem não a possui é vítima da violência física e psicológica.
manipulação de conceitos abstratos, permitindo a quem domina a linguagem alterar o significado dos paradigmas.
forma de justificativa à agressão, já que quem detém o conhecimento considera o ignorante um ser inferior.