Ele se encontrava sobre a estreita marquise do 18º andar. Tinha pulado ali a fim de limpar pelo lado externo as vidraças das salas vazias do conjunto 1801/5, a serem ocupadas em breve por uma firma de engenharia. Ele era um empregado recém-contratado da Panamericana – Serviços Gerais. O fato de haver se sentado à beira da marquise, com as pernas balançando no espaço, se devera simplesmente a uma pausa para fumar a metade de cigarro que trouxera no bolso. Ele não queria dispensar este prazer, misturando-o com o trabalho.
Quando viu o ajuntamento de pessoas lá embaixo, apontando mais ou menos em sua direção, não lhe passou pela cabeça que pudesse ser ele o centro das atenções. Não estava habituado a ser este centro e olhou para baixo e para cima e até para trás, a janela às suas costas.
Talvez pudesse haver um princípio de incêndio ou algum andaime em perigo ou alguém prestes a pular. Não havia nada identificável à vista e ele, através de operações bastante lógicas, chegou à conclusão de que o único suicida em potencial era ele próprio. Não que já houvesse se cristalizado em sua mente, algum dia, tal desejo, embora como todo mundo, de vez em quando... E digamos que a pouca importância que dava a si próprio não permitia que aflorasse seriamente em seu campo de decisões a possibilidade de um gesto tão grandiloquente. E que o instinto cego de sobrevivência levava uma vantagem de uns quarenta por cento sobre seu instinto de morte, tanto é que ele viera levando a vida até aquele preciso momento sob as mais adversas condições.
(In: MORICONI, Ítalo (org.). Os cem melhores contos brasileiros do século. R. Janeiro: Objetiva, 2000)
Em “... não lhe passou pela cabeça que pudesse ser ele o centro das atenções”, os pronomes pessoais destacados exercem, respectivamente, a função sintática de
objeto indireto, sujeito.
complemento nominal, objeto direto.
adjunto adnominal, sujeito.
objeto indireto, predicativo do objeto.
adjunto adnominal, predicativo do sujeito.