Dante Alighieri, em A Divina Comédia, ao chegar ao vestíbulo do Inferno, via a mensagem: “Deixai, ó vós que entrais, toda a esperança!” (tradução de José Pedro Xavier Pinheiro).
Raul Pompeia, em O Ateneu, assim apresentou a entrada do estudante Sérgio, narrador da obra, no estabelecimento estudantil:
“Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta.” Bastante experimentei depois a verdade deste aviso, que me despia, num gesto, das ilusões de criança educada exoticamente na estufa de carinho que é o regime do amor doméstico (...). Lembramo-nos, entretanto, com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido outrora e não viesse de longe a enfiada das decepções que nos ultrajam.
Pode-se dizer, corretamente:
A advertência do pai do narrador não tem o mesmo teor da que está na entrada do Inferno, pois o ambiente escolar cuidará do aprimoramento intelectual.
As decepções do estudante Sérgio são decorrentes da imaturidade juvenil, ao passo que no Inferno de Dante existe uma origem de vida pecaminosa.
“A luta” a que se refere o pai do narrador é pelo melhor aproveitamento escolar, sem o qual haverá uma “saudade hipócrita” ao se deixar o Ateneu.
Tanto na inscrição presente na obra de Dante, quanto na fala do pai de Sérgio, existe o pressuposto de um mundo de sofrimento
Os “felizes tempos” mencionados em O Ateneu demonstram que a obra de Raul Pompeia apresenta a esperança, ausente em A Divina Comédia, de Dante.