Considere a seguinte afirmação do pensador indígena Ailton Krenak: “Nas narrativas tradicionais do nosso povo, das nossas tribos, não tem data, é quando foi criado o fogo, é quando foi criada a lua, quando nasceram as estrelas, quando nasceram as montanhas, quando nasceram os rios. Antes, antes, já existia uma memória puxando o sentido das coisas, relacionando o sentido dessa fundação do mundo com a vida, com o comportamento nosso, como aquilo que pode ser entendido como o jeito de viver”.
Krenak, Ailton. Antes o mundo não existia. In: Novaes, Adauto (org.). Tempo e história. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
A afirmação, acima apresentada, se baseia em uma concepção de narrativas tradicionais, segundo a qual elas
se fundam numa memória coletiva, constituída na transmissão oral, de geração em geração, dando um sentido ético para a existência natural e social.
se originam antes do tempo, são anteriores à história e à vida social, por isso não possuem descrições e explicações argumentadas sobre a realidade.
têm uma função ética, orientam a vida comum e a relação com o cosmo, com base numa argumentação válida que, contudo, não é lógica.
se opõem à narrativa histórica, pois tratam dos mesmos temas e assuntos, mas desprezam a datação, porque esta é um meio de dominação.