Prefeitura de Barra Mansa 2020

Era uma vez no Quénia


Jomo Kényatta é considerado o pai da Uhuru, ou independência do Quênia,

que ocorreu em 12 de dezembro de 1963. Antes disso, o Quênia era uma colônia do

Império Britânico. Em 1952, quando o colonialismo começava a ruir, Kenyatta foi

acusado é sentenciado em um julgamento de fachada que o enviou ao cárcere.

5Acusação? Era considerado o líder dos guerrilheiros Mau Mau, ainda que não

houvesse provas.

Os Mau Mau foram um movimento formado por diversos grupos guerrilheiros

que lutaram entre 19S2 e 1960 contra os britânicos e quenianos leais ao governo

colonial. O objetivo dos Mau Mau era conquistar terra, liberdade e expulsar os

10 colonizadores. Apesar de derrotados militarmente, os Mau Mau foram responsáveis

pela ruína moral do projeto colonial no Quênia. Nenhum império europeu conseguiria

barrar o sol da independência para os quenianos.

Os campos de concentração ingleses conseguiram impor oito anos de terror,

mas não impediram que a colônia, outrora chamada de um país de homens brancos,

15 erguesse suas próprias cores na bandeira queniana. Vítimas de um sistema colonial,

racista, autocrático é exploratório, Kenyatta e seus aliados conseguiram organizar os

maiores movimentos quenianos pela independência da nação e, após décadas,

conquistaram a libertação.

Frantz Fanon, influente intelectual afro-caribenho, partidário da

20 descolonização por via das armas, não aprovaria o método de Kenyatta. O pai da

Uhuru tratou de negociar com o antigo colonizador. Kenyatta nunca reconheceu o

valor dos que lutaram é morreram no movimento Mau Mau. O pai da independência

não distribuiu a terra tão esperada pelos Mau Mau, mas dividiu entre seus aliados. A

independência também proibiu o assunto. Falar e lembrar a luta Mau Mau podia

25 render problemas com um governo que queria abafar o passado.

Cerca de 10 mil Mau Mau morreram por terra é liberdade. Milhares de

apoiadores e suspeitos sofreram em campos de concentração ingleses. Nem uma

década havia passado desde os campos de concentrações nazistas da Segunda Guerra

Mundial serem desativados e, na década de 1950, os britânicos, com a justificativa da

30 missão civilizadora, ergueram campos de morte e tortura por toda a colônia do

Quénia.

Ao fim, com lágrimas e sofrimento, mas com esperança e resistência, o

colonialismo caiu. Porém, sua obra persistiu (é persiste). A liberdade na África raiou

com celebração e acabou em sistemas de partidos únicos que proibiam oposições é

35 barravam processos democráticos. O pai da independência, Jomo Kenyatta, tornou-

se o líder incontestável da República do Quênia. Mas o patriarca do Quênia havia

aprendido o método colonial.

Em 1977, um premiado autor queniano chamado Ngügi wa Thiong'o e um

autor com nacionalidade queniana e zimbabuana Ngugi wa Mirii produziram uma

40 peça de teatro com a participação da população da pequena cidade de Kamiriithu,

localizada nos arredores da capital Nairóbi. Após um grande sucesso a peça foi

proibida pelo governo queniano. Motivo? Ela criticava o governo, denunciava-O como

uma continuação do governo colonial, clamava por terra, liberdade e buscava resgatar

e inspirar o público através do exemplo da luta Mau Mau.

45 A peça se chamava I Will Morry When I Wont (Eu vou me casar quando eu

quiser . Os autores afirmavam que o governo não cumpria seus deveres com o novo.

Nada de democracia, nada de terras e nada de dividir a riqueza .. Ngügi wa Thiong'o foi

preso em sua casa. Não houve acusação nem Julgamento. O acesso à terra e a

liberdade que não existiam nos tempos de colônia também não floresceram no pós-

50 colônia. Mas Isso não podia ser dito.

Aprisionado com outros presos políticos do Quênia independente, Thiong'o

teve que tirar suas próprias conclusões sobre a prisão. Seus algozes não emitiam

nenhuma declaração sobre o motivo de seu encarceramento. Kenyatta desafiara um

poder autocrático e fora aprisionado. Thiong'o desafiara um poder autocrático e fora

55 aprisionado. Um caso de colonialismo e um caso de neocolonialismo,

respectivamente.

Kenyatta não ousou acabar com a obra do colonialismo, mas decidiu exercê-

la. Os brancos que foram embora deixaram suas formas de governança e os que

assumiram decidiram mantê-las. Na prisão, Thiong'o escreveu um livro chamado Devil

60 on the Cross (Diabo na Cru,) om rolos do papel higiênico. Em uma cena da obra. o

autor narra como homens negros do Quênia aprenderam os truques dos antigos

mestres brancos. Estes ensinavam como praticar a dominação autocrática sobre seus

países, não apenas para seu beneficio, mas também para benefício da antiga

metrópole.

65 Mas, se a autocritica elite queniana (e africana) trabalha para si e para os

antigos mestres colonialistas. para quem trabalham os mestres brancos? O autor nos

Informa que todos servem ao maior dominador de todos, o shiema capitalista

imposto pela Europa ao redor do mundo. E, com o apoio de grupos nativos que

desejavam emular o antigo colonizador, ele se mantém em terras além da Europa.

70 Agora, imagine. isso ocorreu na África, Ásia. Oceania e América. Formas de

organizar a sociedade e suas lr,stltulç6es de controle foram desenvolvidas na Europa

e impostas sobre outros continentes para benefício do pequeno continente. Desse

modo, a Eu1opa deu a si mesma o lugar de centro do mundo através de séculos de

escravidão., colonialismo, imperialismo e racismo.

75 Desafiar o dinheiro e seus lacaios rende prisão, censura, exílio e, nos casos

mais extremos, assassinatos. O caso de Jomo Kcnyattct, um aspirante de libertação do

Quênia, não significou a libertação do trabalhador e aldeões do país. Como um

clássico exemplo de capitalismo de terceiro mundo, apenas uma pequena fração dá

sociedade ganhou enquanto a maioria existe com o que sobra. Romper com a obra do

80 colonialismo não foi o caminho escolhido pelos que tomaram o poder na R(!,pública

do Quênia.

Uma população mal tratada num país desigual acabou por ser o foco de muitas

das obras de Ngügï wa Thiong'o. O autor não fora preso apenas por Jomo Kenyaua e

seu sucessor Daniel arap Moi. mas pelo sistema neocolonial que domina a cultura. a

85 economia e a política queniana pós-independência. Kenyatta e Thiong'o são dois

exemplos de uma longa conjuntura histórica. Não se trata de repetição, existe em

particularidades nos dois diferentes momentos históricos de cada um dos

personagens.

Kenyatta buscou descolonizar o Quénia, mas sua descolonização era limitada.

90 Não previa descolonizar-se das formas econômicas, culturais políticas impostaas pelo

Ocidente. Thiong'o buscou ir além. O autor queria descolonizar corações,, mentes e

desfazer os nós que prendem o "lndependente" Quênia ao antigo colonizador. O

neocolonialismo. como termo, saiu de moda:, mas como sistema de dominação do

centro sobre a periferia, ele está em pleno vapor moldando as relações internacionais e

95 dando forma à globalização

o caso da guerrilha Mau Mau e de Ngügï wa Thlong'o servem para

exemplificar uma luta do longa data entre forças progressista que, por um lado,

resiste aos ímpetos colonizadores que gestam desigualdade e de outro forças que

até hoje elevam o passado colonial e sua obra para legitimar o domínio do poder

100 ocidental responsável por um sistema que deixa o planeta à beira da destruição.

Apesar de pouco conhecida nos trópicos latinos, a história queniana é um espelho

para os colonizados do globo que ainda esperam por sair da noite.

{Bruno Ribeiro Oliiveira. Le Monde Oip/omatique. 3 de setembro de 2020.)

Assinale a alternativa em que a palavra tenha sido composta por derivação prefixal.

a

descolonizar (linha 89)

b

encarceramento (linha 53)

c

neocolonial (linha 84)

d

exploratório (linha 16)

e

autocrático (linha 16)

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A
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