A SECRETÁRIA (É uma moça, longa, de óculos e tranças enormes e loiras. Veste-se pudicamente. Traz lápis e block-notes na mão.) - É para bater à máquina, Seu Abelardo?
ABELARDO I - Não. Para estenografar. Nem isso. A senhora sabe redigir. Melhor do que eu. Faça uma carta. Sente-se aí. (Sentam-se perto um do outro.) Dona Aída... Aída loira...
Aída de Wagner. Como é? Não precisa de um Radamés?
A SECRETÁRIA - Preciso que o senhor melhore meu ordenado. O custo da vida aumentou no Brasil de 30%.
ANDRADE, Oswald de. O rei da vela. Uma leitura do teatro de Oswald por Haroldo de Campos. 8.ª ed. São Paulo: Editora Globo, 1990, p. 48. (Obras completas de Oswald de Andrade)
Na sequência do fragmento acima,
Abelardo, adepto do capitalismo, despede-a, pois, se aumentar o salário dela, terá de aumentar o de todos.
A secretária explica que precisa muito de um aumento porque pretende se casar com um rapaz que conheceu.
Abelardo a galanteia, mas ela o recusa, ao que ele, enfurecido, adverte-a a não pedir vales em seu escritório.
Abelardo a convida a fazer um piquenique debaixo de uma mangueira e ela aceita, pois o ama, apesar de noiva.
A secretária confidencia que é noiva de um velho milionário, com quem pretende se casar por puro interesse.