UECE 2010

  “À natureza profunda do ente humano repugna ver-se isolada do convívio dos seus semelhantes, e o pior de todos os castigos é aquele que fere a nossa natureza profunda.”

(Rachel de Queiroz. O quente e o apertado. In: As meninas e outras crônicas.)

 

No ano do centenário de nascimento da escritora cearense Rachel de Queiroz, a Universidade Estadual do Ceará presta-lhe homenagem. 

 

TEXTO 1 

 

[1]   Não me lembro como se chamam as  

tais bonecas folclóricas russas: sei que são  

ocas e abre-se a boneca maior e dentro dela  

há uma menor, e dentro dessa, outra menor  

[5] ainda, e depois outra e mais outra, até  

chegar à última, que é uma simples  

miniatura de boneca. No mesmo gênero,  

também, é aquele conto de fadas: "lá no  

mar tem uma ilha, dentro da ilha tem um  

[10] castelo, dentro do castelo tem uma torre,  

dentro da torre tem um quarto, dentro do  

quarto tem uma arca, dentro da arca tem  

uma caixa, dentro da caixa tem um cofre,  

dentro do cofre tem um frasco, dentro do  

[15] frasco tem uma pomba, dentro da pomba  

tem um ovo, dentro do ovo tem uma chave e  

é essa chave que abre a porta da prisão  

onde está a princesa encantada". 

  Pois a gente também é assim. A  

[20] princípio eu pensava que, com a passagem  

das diferentes idades do homem, o maior ia  

substituindo o menor, quero dizer, o menino  

ficava no lugar do neném, o adolescente no  

do menino, o moço no do adolescente, o  

[25] homem feito no do moço, o de meia-idade  

no do homem feito, o velho no lugar do de  

meia-idade e por fim o defunto no lugar de  

todos. Mas depois descobri que os indivíduos  

passados não desaparecem, se incorporam,  

[30] ou, antes, o indivíduo novo incorpora os  

superados como se os devorasse, e uns vão  

ficando dentro dos outros, tal como as  

bonecas russas do começo da história. 

  E, assim, dentro de cada um de nós,  

[35] a gente procurando sempre encontra os  

perfis superpostos, encartados um por  

dentro do outro, sem se misturarem. É só  

saber como esgaravatar e você descobrirá  

fácil no sentencioso senhor de cinquenta  

[40] anos o inseguro pai de família principiante  

que ele foi aos trinta anos ou o belo atleta  

descuidado que foi ele aos dezoito. Ali está  

cada um, aparentemente esquecido, mas  

incólume. E estanques todos. Porque um não  

[45] penetra no outro e aparentemente um não  

tem o mínimo em comum com o outro; nem  

sequer um influi no outro – as mais das  

vezes são antípodas e adversários. 

  Faça uma experiência: pegue um  

[50] livro, uma foto, reveja um filme, encontre  

alguém, qualquer desses serve, contanto se  

refira especificamente a determinado tempo  

da sua vida. E então magicamente se suscita  

aquele instante perdido do passado, com  

[55] uma força de momento atual. Espantado,  

você se indaga: então esse fui eu, era eu?  

Que tem em comum com o você de hoje,  

aquele estranho que subitamente acordou ao  

apelo do seu nome, debaixo da sua pele?  

[60] Terá em comum só mesmo o nome e a pele,  

porque o resto, no corpo e na alma, tudo é  

outro. Deformado ou gasto, mas sempre  

diferente. Você é outro, outro. E quase não  

acredita ter sido você também aquele rapaz  

[65] desvairado, ou sonso, ou bobo e  

terrivelmente inexperiente que de súbito  

emergiu de dentro dos seus ossos e das suas  

velhas lembranças. 

  E na sua avó venerável você também  

[70] pode descobrir a rapariga inconsequente que  

ela foi um dia, e no seu severo confessor de  

hoje o seminarista em crise religiosa de  

trinta anos atrás. É só saber procurar. 

A gente diz disso: "águas passadas". Mas  

[75] talvez seja melhor dizer águas represadas,  

águas recalcadas. Porque basta bater na  

pedra, a fonte emerge, o que não  

aconteceria se as águas fossem passadas  

realmente. 

[18 out. 1972] (Rachel de Queiroz. In: As meninas e outras crônicas. p. 133-134.)

 

Sobre o emprego do vocábulo "assim" nas linhas 19 e 34, considere as seguintes afirmações:

 

I - Os dois funcionam como elementos de coesão entre parágrafos.

II - O da linha 19 aponta para o que foi dito anteriormente.

III - O da linha 34 tem valor de conclusão.

 

Está correto o que se afirma

a

apenas em I e II. 

b

em I, II e III.

c

apenas em I e III. 

d

apenas em II e III. 

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Resposta
B
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